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segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

canção de natal

Roubei do Wikipedia:
capa da primeira edição
Charles Dickens sempre me remeteu ao Natal. Talvez seja efeito de uma de suas obras mais conhecidas, 'Canções de Natal', de 1843, que acabei de ler na sua versão original. Digo isso porque a história já teve várias adaptações: cinema, teatro, musical, animações, quadrinhos e versões resumidas, como a que eu havia lido nas aulas de inglês. Basicamente fala sobre o rabugento Ebenezer Scrooge, que odeia o Natal. Ele não sorri. Não emite nenhum sinal de cordialidade. Vive sozinho e rejeita qualquer tentativa de aproximação. E segue assim até a noite de Natal em que recebe a visita do fantasma de seu ex-sócio, morto há alguns anos, que anuncia outros três espíritos, representando o passado, o presente e o futuro. Com eles, Scrooge embarca para uma viagem pelo tempo e reflete sobre os motivos que o deixaram tão amargurado. Descobre, então, que tudo seria mais fácil e leve se voltasse a cultivar o sorriso no rosto. O livro foi um dos primeiros a retratar o Natal tal e qual o conhecemos: as mesas fartas, os gestos solidários, o lado emotivo mais aguçado e a esperança de que tudo será melhor. Excelente pedida para o fim de ano :-)

“É justo reconhecer que, por uma lei nobre do mundo, enquanto a tristeza e a doença são tão contagiosas, da mesma forma se mostram o riso e o bom humor.”

“Ele correu para a janela, abriu-a e colocou a cabeça para fora. Não havia neblina ou névoa, o dia estava claro, brilhante, exprimindo uma alegria jovial; fazia frio, muito frio, de congelar o sangue nas veias. O sol emitia sua lua amarelo-ouro e o céu estava celestial, o ar fresco percorria-lhe os pulmões.”

Adaptação para animação digital (2009)

sábado, 27 de dezembro de 2014

o presente do meu grande amor

Queria terminar o ano lendo belas histórias de Natal. Sabe Natal do hemisfério norte, com neve, frio e muitos pinheiros enfeitados? Pois é. Daí dei de cara com ‘O presente do meu grande amor’ na livraria. São 12 contos organizados pela escritora Stephanie Perkins. Ela mesma assina um deles, ‘É um Milagre de Yule, Charlie Brown’. Em comum, todos trazem neve e adolescentes apaixonados que vão salvar as festas, o que faz da coleção um young adult natalino. Isso me decepcionou. Não era exatamente o tipo de literatura que esperava. Com exceção de um ou outro conto, a leitura não empolgou. Mas dois se destacaram pela sutileza. ‘Anjos na Neve’, de Matt de La Peña, conta os dias de fome de Shy, filho de mexicanos em Nova York. Até que uma bela moça aparece e lhe oferece o melhor jantar da sua vida. Bonitinho. Gostei ainda de ‘Bem-Vindo a Christmans, Califórnia’, de Kierten White, que também traz mexicanos. Lá, um cozinheiro parece saber exatamente qual prato vai alegrar cada um de seus clientes. Muito, muito parecido com o delicioso ‘A senhora das especiarias’, da indiana Chitra Divakaruni, e com o filme ‘Chocolate’ (2000), dirigido por Lasse Hallström. Todos são seduzidos por aromas e sabores, afinal.

Alguns contos tentam o estilo fantástico, mas acabam se perdendo no caminho. Acredito que a tradução não tenha ajudado a entender certas passagens. Aparentemente, o livro foi para a gráfica às pressas, sem revisão detalhada. Mas serve para alimentar o clima festivo e sensível. Lembrou ‘Deixe a neve cair’, reunião de três contos de Maureen Johnson, John Green e Lauren Myracle, que li nesta mesma época ano passado.

Agora, se quiserem mesmo se emocionar, leiam ‘A pequena vendedora de fósforos’, escrito em 1845 pelo dinamarquês Hans Christian Andersen. Lá o final surpreende pela realidade. Belíssimo, diga-se de passagem. Mas triste toda vida.

domingo, 21 de dezembro de 2014

pela metade



Leituras que ficaram pela metade. Por vários motivos, por vários outros livros. 

'Faça acontecer' ganhei de presente. Narrativa que mostra o caminho do sucesso de Sheryl Sandberg, executiva do Facebook. Leitura leve, parece um bate-papo. Já aprendi algumas coisas com ela ;-)

'O cão que guarda as estrelas' é um manga lindo. Ainda não terminei porque estou com medo de sofrer :-/

'Flush' está na minha maratona animal. É Virginia Woof na mente de um cão.

'O homem que vive' é puro inverno. Todas as lembranças do protagonista estão nessa estação.  Seria mais interessante lê-lo observando a neve cair. Não sendo possível, vai ser o conforto imaginário para me proteger do verão infernal. Escrito por um acadêmico, muito lido por mim na faculdade, está cheio de frases de efeito.

'The catcher in the rye' faz parte da minha lista 'só eu não li'. Confesso que esperava mais. Ali estão todos os estereótipos dos adolescentes, resmungões, perdidos, 'me deixa'. Haha! Vamos ver como termina.

'Moby Dick' encalhou. Uso o trocadilho para dizer que esse foi um dos livros mais chatos que caiu nas minhas mãos. Mas vou ajudar essa cachalote a se vingar de seus caçadores. Ah, se não vou!


'Como ter uma vida normal sendo louca' traz dilemas e soluções 'Sex and the City' para quem está na cada dos vinte. Divertido, ótimo para ler na praia.

'Alta fidelidade' mostra os romances que não deram certo de um homem de 35 anos. Interessante ver o ponto de vista masculino. O que me chamou a atenção, porém, é a trilha sonora. Adoro ouvir música nos livros :-)

sexta-feira, 19 de dezembro de 2014

nós, animais

'Nós, animais', da professora Evely Libanori, é a reunião de trinta crônicas que retratam o amor pelos bichos e a indignação diante das constantes crueldades. Amante dos gatos, a autora faz deles personagens constantes. Ora homenageando os que se foram, ora mostrando a graça do convívio diário com esses felinos. Quem os conhece sabe o quanto são amorosos e divertidos. É o que mostra, por exemplo, a brincadeira criada por um de seus bichanos a partir da cabeça de um santo. Outras histórias são demasiadamente tristes. E junto com Evely sentimos a dor do lagarto incendiado, dos filhotes de gato jogados no bueiro, da égua obrigada a puxar carroça e da cachorra que vive acorrentada. As frases são curtas e cheia de reticências. Demonstram o desabafo e a impotência diante de situações que não podem ser revertidas. Restam as várias menções a Deus, que fazem a escrita parecer uma oração. Felizmente, pessoas que lutam em prol dos animais existem. Gostar dos bichos é, sobretudo, deixá-los livres. ‘Um bem-te-vi no meu caminho’ é meu texto preferido. Pássaro novo que não sabia voar cai na calçada. É resgatado, cuidado. Junto com sua protetora ouve Strauss, Vivaldi e Mozart. Sua presença já é parte da rotina, da casa. Mas pássaro não é para ficar preso. O dia da despedida chega e ela o ajuda a alcançar o céu. Linda crônica. Linda mensagem. E isso é respeito. “Ele mudou tanto em duas semanas. Como cresceu! Pelo que vejo, em, no máximo, mais uma semana ele vai voar. E vai voar para longe de mim.”

quarta-feira, 17 de dezembro de 2014

matilda


Por que ninguém me apresentou a este livro quando eu tinha oito anos? É para esta idade que volto ao ler ‘Matilda’, do autor galês Roald Dahl, o mesmo de ‘A fantástica fábrica de chocolate’. O livro é uma delícia e me fez voltar ao passado e às boas e eternas lembranças da infância. Não por conta do enredo ou das características das personagens, mas pelas boas sensações que me trouxe. Descobri-o por acaso no Youtube. Conta a história da super inteligente Matilda. Ela tem apenas cinco anos. Aprendeu a ler e a fazer contas sozinha. Seus pais não estão nem aí para as habilidades da filha. Pelo contrário, acham estranho ela ficar enterrada nos livros quando há programas mais interessantes passando na TV. Enquanto isso, Matilda descobre a biblioteca pública. Em poucos meses, devora todos os livros da seção infantil e se debruça nos grandes clássicos da literatura. O livro é repleto de estereótipos, como a diretora carrasca, a professora boazinha, pais que não dão a devida atenção aos filhos, travessuras como vinganças e a alienação da sociedade diante da comunicação de massa e seus desejos de consumo. Escrito em 1988, ganhou adaptação para o cinema e para o palco, em um musical no Reino Unido. As ilustrações, com traços simples, dão um tom engraçado para a história. Se estiverem buscando indicações de livros para crianças, aqui está uma boa pedida. Com direito a nostalgia ;-)

quarta-feira, 26 de novembro de 2014

o iluminado

Capa de uma das edições brasileiras.
Traz o quarto proibido: 217
Esperava mais. Foi com essa sensação que terminei a leitura de 'O iluminado', de Stephen King. Talvez o primeiro livro que eu li depois de assistir a sua adaptação cinematográfica, aliás, há muitos anos. Mas o filme me marcou tanto que ainda estava bem vivo na memória, sobretudo as cenas na neve.

O livro seguia bem até as últimas 20 páginas. Jack é professor e escritor que carece de inspiração (SK gosta de escritores em suas narrativas. Vide o excelente Misery). Tenta se curar do alcoolismo, doença que reforça seu temperamento agressivo. A impulsividade o levou a quebrar o bracinho do filho quando ele tinha apenas dois anos e a esmurrar um de seus alunos. Resultado: perdeu o emprego, ficou sem grana e teve que aceitar a única proposta que apareceu: ser zelador de um hotel nas montanhas do Colorado (EUA) durante o inverno. Ou seja, quando o local fica totalmente isolado por causa da neve. Mas o livro é de terror, suspense. E o Overlook é bem propício para deixar um ser humano perturbado ainda mais louco. Danny é o filho. Tem cinco anos e é iluminado. Ele vê coisas. Tem premonições. Seu melhor amigo é imaginário e, por muitos momentos, é muito adulto para a idade. A esposa é a Wendy, mulher sem iniciativa que ainda acredita na recuperação do marido. Os três vão para o hotel.

Assim que chegam, as alucinações começam. O menino vendo pessoas mortas. O pai ouvindo vozes. E a mãe ainda acreditando na salvação da família. Eu pensei que sentiria mais medo. Até procurei ler durante a noite para criar um clima. Mas, exceto por uma passagem na banheira (sempre ela), não deu certo. Os últimos lances com o tal baile que aconteceu por lá foram bem cansativos e piegas. Muito longe de amedrontar. Enfim, leiam sem sustos (rá!). Desta vez, fico com o filme, com o Kubrick e, claro, com o Jack Nicholson ;-)


Cartaz do filme de 1980

terça-feira, 25 de novembro de 2014

o irresistível café de cupcakes

Mais um chick-lit para minha lista. ‘O irresistível café de cupcakes’ é o livro de estreia da norte-americana Mary Simses. O título me fez lembrar 'My blueberry nights' (2007), belo filme estrelado por Norah Jones, e talvez por isso me rendi à leitura. Mas aqui os motivos são bem diferentes. Sem pretensão, conta uma história bonitinha e gostosa. Leitura para o fim da tarde durante as férias. O enredo é simples e previsível. Ellen tem 35 anos, é bem-sucedida profissionalmente e noiva de um bonitão da alta roda política. Para atender o último pedido da avó, vai parar numa cidadezinha litorânea. Lá descobre a simplicidade e o boa pinta Roy. Resultado: apaixona-se por tudo. E o noivo? Quem conhece este tipo de leitura, já deve imaginar o final. Mas vale pela descontração e pelo passeio por esta cidade do Maine, estado ao norte dos Estados Unidos. Fiquei morrendo de vontade de me perder por lá, nos campos de blueberry que são mencionados. Aliás, o site da autora traz imagens que nos transportam para o cenário que idealizou para seu livro. Outro ponto interessante da leitura é a seleção musical que Simses nos dá, e que embalam os pensamentos da protagonista. Ótimo para quem curte jazz, blues e country. Anotei todas e criei a playlist The Irresistible Blueberry Bakeshop & Café no Spotify. Ouçam e embarquem nesta viagem também :-)

Plantação de blueberry



A playlist :-)

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

uma fábula

Peço licença para reproduzir a bela fábula do escritor mineiro Autran Dourado (1926-2012). Leiam com o coração :-)

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O pintassilgo
por Autran Dourado

Era uma vez um pintassilgo amantíssimo, capaz de dar a vida pelos seus filhotes. Um dia, trazendo no bico uma minhoca para eles, não os encontrou. Caindo no maior desespero, saiu a procurá-los pela floresta; os ninhos que ele encontrava estavam vazios. Vendo-o tão desesperado, disse um pardal que não adiantava procurá-los, pois os vira numa gaiola na janela da casa do proprietário da floresta.


Cheio de esperança, o pintassilgo voou para lá. Viu logo, numa gaiola dourada, os seus filhotes presos. Começou a bater o peito, o bico e a cabeça na grade da gaiola. Inutilmente, porque o arame da gaiola era muito grosso. Voltou para a floresta.


No dia seguinte estava de volta, trazendo no bico uma erva. A erva era venenosa e os filhotes morreram.

Moral da história: antes morrer do que ficar preso. Foi o que disse o pintassilgo.

domingo, 23 de novembro de 2014

timoleon vieta

O livro traz esta imagem várias vezes, 
 sempre com uma frase atribuída ao cão
'Por quê? Por quê?' Fiquei a perguntar a Dan Rhodes no fim da leitura do seu 'Timoleon Vieta volta para casa'. Se existe um livro do qual eu gostaria de mudar o desfecho, este é um deles. Mas para isso eu teria que mudar a humanidade.

Cockcroft é um inglês decadente que mora na Toscana. Ele vive dos direitos autorais dos jingles que compôs décadas antes. Está na casa dos sessenta anos e costuma hospedar rapazes bonitos em troca de favores sexuais. O problema é que ele se apega a eles e sofre a cada rompimento. E é o medo de ficar sozinho que o leva a cometer o ato mais cruel da sua vida. Ele também abriga o simpático Timoleon Vieta, cachorrinho preto com manchas brancas e caramelo. O livro começa dizendo que ele faz parte da melhor raça de cães, os vira-latas. Timoleon, que tem os olhos mais cativantes já vistos, apareceu durante um temporal na casa de Crockroft e por lá ficou, tornando-se seu melhor amigo e confidente. Durante cinco anos presencia vários casos amorosos do 'dono'. Como ele mesmo diz, os rapazes vão, o cachorro fica. Até que surge uma figura misteriosa que diz ser refugiado da Bósnia. O cachorro não o aprova. Mas com medo de perder seu Bósnio, Cockcroft acaba cedendo aos pedidos do novo companheiro, e abandona o cão nas ruas de Roma. 


Na tentativa de voltar para casa, e aqui temos certa analogia com 'Lassie volta para casa', de Eric Knight, o cão depara-se com diferentes pessoas. E nós passamos a conhecer a história de cada uma delas até o encontro com Timoleon. Tem a chinesinha que encontra o cão no velório do padastro. A moça do País de Gales que confessa seus amores perdidos nas fontes de Roma. A menina de Camboja que vê o cão pelas fotografias da irmã que se casou com um dentista francês. A muda que apaixona-se por um deliquente, entre outros. Na verdade, o cão é o motivo para os vários contos apresentados no romance. Podemos dizer que, em sua jornada, o cão que se apresenta como coadjuvante de outras vidas.





Confesso que a leitura me incomodou. Sobretudo pelo final. Fiquei pensando se não poderia ter sido diferente. Mas, afinal, o ser humano é mesmo assim: cruel, individualista e cheio de loucuras que machucam. Fica o exemplo do afeto dado pelo cachorro. Timoleon Vieta só aumentou o meu amor pelos bichos :-)








quinta-feira, 13 de novembro de 2014

a cultura da participação


Conclui “A cultura da participação – Criatividade e Generosidade no mundo conectado”, de Clay Shirky, com a sensação de quero mais. E de que posso mais. No livro, o autor expõe as vantagens de estarmos conectados. Começa mostrando o que as pessoas fazem no tempo livre, que ficou maior depois da revolução industrial. Na Inglaterra, antes, bebiam gim. Depois, veio a TV e começamos a passar horas de nossas vidas diante da tela. Segundo ele, tempo perdido e não produtivo, já que a comunicação é de uma só via. Hoje, a rede social é a bola da vez. Conta que o ‘compartilhamento’ permite avanços sociais, tecnológicos, científicos, dentre outros. “Algo que torna a era atual notável é que podemos agora tratar o tempo livre como um bem social geral que pode ser aplicado a grandes projetos criados coletivamente, em vez de um conjunto de minutos individuais a serem aproveitados por uma pessoa de cada vez.”

Também derruba conceitos sobre as gerações baby boom, x, y, z etc. Na verdade, é tudo balela. A diferença está na ferramenta e não nos anseios ou comportamento dos jovens.

Isso me fez rever a opinião que tenho sobre o exibicionismo exacerbado nas redes sociais. “Quando eu era adolescente, não fazia isso”, penso. E o que Shirky comentaria? “Era, sim, só não tinha as ferramentas para tal.” Bem, lembrei do 'Caderno de Recordação' que toda menina tinha e que passava de mãos em mãos solicitando um depoimento a nosso respeito. Idem para a 'Enquete', caderno que trazia em suas páginas questões a serem respondidas pelos amigos. Não eram on-line, mas compartilhavam. No fundo, queríamos que outros lessem as boas impressões a nosso respeito.

E a internet surge como o grande avanço para atiçar ainda mais o desejo de trocar informações, sempre por meio de interesses comuns. É a lógica do ‘publicar’. Se antes precisávamos de alguém que ‘autorizasse’ o envio de uma mensagem nossa para a grande massa, hoje isso não é mais necessário. Vejam o cyberativismo e suas decorrentes manifestações nas ruas. Isso porque, e o autor é bem enfático neste ponto, pessoas com os mesmos objetivos se unem e, juntas, elas conseguem encontrar as soluções para seus problemas. O que não aconteceria se agissem sozinhas. Isso vale desde uma reinvindicação no seu condomínio, discussões sobre doenças raras, fãs querendo chamar a atenção do ídolo ou denúncias de agressões aos direitos humanos. Passa ainda pelo aperfeiçoamento da própria tecnologia, como no caso do Linux. O código-fonte do sistema é aberto a todos que querem melhorá-lo. A própria Wikipedia permite edições em seu conteúdo. E sem a necessidade de se 'logar'. Sem cadastro, fica muito mais fácil a participação. 

Enfim, ele dá vários exemplos de como podemos aproveitar a ferramenta da qual dispomos. O livro termina com um episódio bem bacana: uma garota de quatro anos está assistindo a um programa de TV. Em determinado momento ela corre para trás da tela. Todos pensam que ela queria ver o que estava ali, se era lá o local das personagens. Mas não. Ela procurava o mouse. Para interagir. E quem sabe mudar alguma coisa. “Procurando o mouse” é o capítulo final. Uma deixa para vermos que a mudança pode estar, sim, em nossas mãos.

quarta-feira, 29 de outubro de 2014

maratona animal

Sou entusiasta das causas voltadas aos direitos dos animais. Que eles pensam, sentem dor e se apaixonam são questões indiscutíveis para mim. Tampouco preciso de pesquisas científicas que me comprovem isso. Contudo, muitas vezes elas são necessárias para convencer os mais resistentes. Mas basta um rápido olhar para um dos meus cães para saber que a briga faz sentido. Até que todos os bichos do mundo voltem a sorrir J

Estimulada por uma lista que vi na Estante Virtual, resolvi fazer essa maratona literária. Vou ler vários livros que trazem os animais como tema principal. Afinal, como diz Antonio Candido, a literatura “manifesta emoções e a visão de mundo dos indivíduos e dos grupos; ela é uma forma de conhecimento, inclusive como incorporação difusa e inconsciente.”

E aí? Alguém se habilita a ir comigo nesta prova cheia de emoção?

A lista na Estante Virtual




terça-feira, 28 de outubro de 2014

o pintassilgo

Está aí um livro de 720 páginas que li praticamente ‘numa sentada’. Logo no início fui cativada pela história, que começa com um homem escondido em Amsterdam. Sem entender o que se passa, retrocedemos alguns anos, direto para um atentado no Metropolitan Museum of Art, em Nova York. O ponto zero.
 
Em “O pintassilgo” (The goldfinch), o protagonista é Theo Decker, de 13 anos. Após ter aprontado na aula, ele tem que ir junto com a mãe falar com o diretor da escola. Antes, porém, uma chuva faz com que eles se abriguem no museu, no meio do caminho. A mãe é apaixonada por arte e fica feliz em mostrar para o menino o seu quadro favorito, o Pintassilgo. Aliás, todo o romance da norte-americana Donna Tartt gira em torno dessa obra, pintada em 1654 pelo artista holandês Carel Frabitius, discípulo de Rembrandt, e hoje exposta no Royal Picture Gallery Mauritshuis, em Haia, na Holanda.
 
Mãe e filho passeiam pelas galerias e, num breve desencontro entre os dois, há a explosão e tudo vem abaixo. O garoto sobrevive e, ao sair dos escombros, leva com ele o quadro holandês. Como superar a morte da mãe e o que fazer com o objeto que furtou são questões que o atormentam. Sem saber a localização do pai, ele é levado para a casa de um amigo. Tempo depois, o pai reaparece e o leva para Las Vegas. No deserto, conhece o russo Boris, que tem mais ou menos sua idade. Os episódios vividos pela dupla me remeteram ao romance “On the road”, de Jack Kerouac, publicado em 1957. O russo lembra o rebelde Dean Moriarty, com seus inúmeros e chatos “Iuuupi! Vamos lá!”. Enquanto Théo é Sal Paradise, que segue a onda do amigo. Tanto lá quanto cá, fiquei entediada com as aventuras. Assim como fiquei nas últimas páginas com tantas divagações repetitivas. Mas nada que comprometa o enredo de Tartt, que felizmente, é muito mais interessante. Inclusive, com direito a um thriller policial lá pelas tantas. Além de pitadas de Dostoievski, Proust, Yeats. 

A autora traz ainda muitas referências da música, das artes plásticas e das antiguidades, já que Theo caminhará também por essas veredas. “Quando estamos tristes – pelo menos eu sou assim – pode ser reconfortante nos apegarmos a objetos familiares, às coisas que não mudam.” Atenção sobretudo aos diálogos dele com Hobie, amigo-pai-padrinho que ganha no decorrer da trama. Vendedor do Prêmio Pulitzer em 2014, vai virar filme em breve. Fica muito a dica.


Trechos:
 
“No inverno, pelo menos, você pode pôr um casaco a mais...”
 
“Não combina com nada que eu tenho, mas não acontece sempre de aquela coisa inapropriada, aquilo que não se encaixa de fato, ser curiosamente a mais querida?”
 
“Todos sempre querem conversar, mas gosto de ficar em silêncio.”
 
“A maioria das pessoas parecia satisfeita com o fino esmalte decorativo e a ardilosa iluminação de palco que, às vezes, fazia a atrocidade intrínseca de a desagradável situação humana parecer de certa forma mais misteriosa ou menos repugnante.”
 
“Mistura deliciosa de gengibre e figos, com chantili e raspas minúsculas e amargas de casca de laranja por cima.”
 
“É difícil concertar as coisas. Você nem sempre tem essa chance.”
 
“O objetivo das coisas – das coisas belas – não é te conectarem a uma beleza maior?”

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

os dez livros mais marcantes


Fui convidada no Facebook a dizer quais são os dez livros que mais me marcaram. Embora possa mudar a qualquer instante, eis a minha lista:

Memorial do Convento, de José Saramago: a história de amor de Baltazar e Blimunda, sete-sóis e sete-luas, é linda. Sem contar a simbologia por trás da dupla e demais personagens. Aliás, vou encaixar aqui outros dois livros de Saramago: 'As intermitências da morte' e 'Ensaio sobre a cegueira'. Todos hilários e muito inteligentes.

Intérprete dos Males, de Jhumpa Lahiri: sou apaixonada pela Índia. E esse livro só aumentou minha afeição por tudo o que vem desse país. São vários contos que mexem com nossos sentimentos.

A insustentável leveza do ser, de Milan Kundera: o que é o amor, afinal? Talvez esse livro possa dar algumas pistas. A versão para o cinema ficou muito boa também. Outro romance que vai nesta linha é 'Travessuras da menina má', de Mario Vargas Llosa. Deveras bom também. 

O mundo de Sofia, de Jostein Gaarder: acredito no poder do young adult (YA) para incentivar a leitura. Está aí um dos livros que li na adolescência e que ainda hoje tem seus reflexos.

Melancia, de Marian Keyes: meu primeiro chick-lit. Veio em boa hora e me ajudou a transformar lágrimas em risos.

1984, de George Orwell: será que não vivemos isso? Essa foi a pergunta que fiz nas duas vezes que li o livro, num intervalo de 15 anos entre uma leitura e outra. Aposto que ainda continua atual.

O processo, de Franz Kafka: sabe aqueles sonhos e pesadelos malucos que temos? Pois Kafka soube transformá-los em literatura. Incluo ainda aqui 'A metamorfose'.

O morro dos ventos uivantes, de Emily Brontë: tem o trecho de livro que mais gosto. Algo assim: amo tanto meu pai que gostaria que ele morresse primeiro. Assim, eu lidarei com sua morte e não ele com a minha (...)

Crime e castigo, de Fiódor Dostoiévski: quem nunca se sentiu culpado? Talvez não por um assassinato, espero, mas todos nós temos que lidar com dúvidas sobre nossos atos. Romance que vai fundo na consciência do personagem. Chegamos a sentir sua aflição.

Música ao Longe, de Erico Verissimo: o primeiro romance que li. Tinha uns 10 anos. Com a professora Clarissa, a protagonista, comecei a escrever num diário. Mesmo com o fundo político, o livro é leve e nos deixa com aquele ar sonhador. Antes de Música ao Longe, Verissimo escreveu o romance 'Clarissa', que mostra a adolescência dessa mesma personagem. Após, veio 'Um Lugar ao Sol', que encerra, vamos dizer assim, a 'trilogia Clarissa'. Todos inesquecíveis, sobretudo os dois primeiros. E já inclui vários livros, vai mais um aqui do mesmo autor: 'Olhai os lírios do campo'.

Desafio todos que passarem por aqui a elencarem suas leituras mais marcantes também ;-)

domingo, 3 de agosto de 2014

a festa da insignificância

"A insignificância, meu amigo, é a essência da existência."

De Milan Kundera, eu li “A insustentável leveza do ser”, livro que foi para a tela dos cinemas numa linda adaptação com Juliette Binoche no papel principal. Por aqui, houve certo furor em torno do seu novo romance, já que o autor tcheco, que agora escreve em francês, ficou mais de dez anos sem lançar nada. “A festa da insignificância” é como um bate-papo entre amigos num fim de tarde. Tem o frescor da primavera. Recomendo que seja apreciado com um vinho branco gelado. Ou talvez com um armanhaque, tal e qual o adquirido por Rámon, um dos amigos que protagonizam a história. 

Tudo começa com Alain caminhando pelas ruas parisienses refletindo sobre o umbigo exposto das moças. Ele não consegue entender o porquê desta parte ter se tornado objeto de desejo, lugar que já foi dos seios, das coxa e da bunda. Sua conclusão é que a massificação imperou definitivamente, já que todos os umbigos são iguais, ao contrário das demais partes citadas. É o fim da individualidade. Esta é uma entre tantas metáforas para tratar da insignificância da vida e de muitas coisas na quais acreditamos e pelas quais brigamos. Enquanto divaga sobre as formas de sedução feminina, no mesmo instante e nas proximidades do Jardim de Luxemburgo, Ramón tenta em vão assistir à exposição do artista expressionista russo Marc Chagall. Mas desanima-se com a fila. Nisso encontra um velho conhecido que acaba de receber o resultado de seu exame: não está com câncer. Algum motivo, contudo, o impele a dizer que, sim, está doente. Daí temos o convite para sua festa de aniversário e o encontro com os outros dois amigos, Charles e Calibã. Com eles vamos refletir sobre os motivos que nos levam a viver, a fingir, a querer e a morrer. "As pessoas não podem se atirar umas sobre as outras sempre que se encontram. Em vez disso, tentam jogar no outro o constrangimento da culpabilidade. Ganhará aquele que conseguir tornar o outro culpado", pensa um deles enquanto tenta entender seus próprios dilemas. Observadores, não deixam escapar nada, nem mesmo os que se escondem. "O silêncio chama a atenção. Pode impressionar. Te tornar enigmático. Ou suspeito."
Um dos pontos altos do livro são as conversas imaginárias com a mãe desaparecida de um deles e do ditador russo Stálin com seus subalternos. Só me fez querer mais deste autor. Só me fez querer caminhar sem compromisso, com pensamentos soltos, pelas ruas e parques de capital francesa.

Mais que um parque
"Lá, a atmosfera estava mais agradável; o gênero humano parecia menos numerosos e mais livre: havia os que corriam, não porque estivessem apressados, mas porque gostavam de correr; havia os que passeavam e tomavam sorvete; havia no gramado discípulos de uma escola asiática que faziam movimentos bizarros e lentos; mais adiante, no imenso círculo, havia grandes estátuas brancas de rainhas e de outras nobres damas da França, e, ainda mais adiante, no gramado entre as árvores, em todas as direções do parque, esculturas de poetas, de pintores, de sábios."

Jardim de Luxemburgo, cenário do livro

domingo, 27 de julho de 2014

o homem do bosque


O livro de Scott Spencer tem um toque de ‘Crime e Castigo’, de Fiódor Dostoiévski. Mas sem a mesma complexidade psicológica. Em determinados momentos me remeteu ainda ao filme 'Match Point' (2005), de Woody Allen. No romance russo, o protagonista Raskólnikov mata duas pessoas e tem que lidar com a culpa pelo crime que cometeu. Entregar-se ou não? Nós somos lançados ao seu interior e sentimos na pele sua angústia e o seu estado febril. Foi um dos melhores livros que eu li. A estrutura narrativa de “O homem do bosque”, todavia, é bem mais simples. No filme, que passeia pelo mesmo 'bosque' dostoievskiano, o assassino vai contar com a sorte, o tal 'ponto final'.
Já o enredo de Spencer, que intercala a visão de diversas pessoas, fala de assassinato não premeditado. Após alguns problemas que tem para receber o pagamento de um cliente, o marceneiro Paul Phillips resolve espairecer no bosque perto de Nova York. Lá vê Will Claff espancando um cachorro. Aliás, é pelo motivo que levou esse homem a bater no cão que começa o livro. Indignado, revida os golpes e, sem se dar conta da sua força, mata o cara. Assim como no livro de Dostoiévski, não há testemunha e ele vai embora sem ser visto. Leva com ele o cão, que chama de Shep. Mas a culpa e o medo de ser preso o perseguem. Tudo isso põe em cheque a relação que tem com Kate Ellis, antes alcoólatra, hoje famosa escritora amparada na religião. Também é algo que vai comprometer seu estilo de vida, mais solto, mais liberto dos prazeres mundanos. O romance, escrito em 2010, passa-se bem na transição do século XX para o XXI e tem como pano de fundo o boom do milênio, o Y2K, que na história é apenas “uma tentativa desesperada de encontrar um significado, uma narrativa previsível.”  Há muitas passagens cansativas, sobretudo no que diz respeito à Kate. Mas o desfecho, que fica em aberto, vale a leitura, assim como a relação que Paul tem com Shep. E que rende comoventes cenas.  

Frases

Aceitação unânime é sinal de mediocridade.”

“Anos de serviço lhe ensinaram que o caminho para o inferno é pavimentado com palavras adicionais. Pessoas que sabem como o mundo funciona falam o mínimo possível.”
“Coisas que achamos que vão nos perturbar para sempre perdem seu poder com o passar do tempo.”
“A infelicidade é como uma vela queimando dentro das pessoas; seu odor está sempre presente no ar.”

sexta-feira, 18 de julho de 2014

fahrenheit 451


“Sempre se teme o que não é familiar.”

Os livros estão banidos e todos que forem encontrados portando este objeto terão a casa e seus exemplares queimados. Afinal, “o livro é uma arma carregada na casa vizinha.” Então, a ordem é “queime-o. Descarregue a arma”. Esta é a tarefa dos bombeiros de ‘Fahrenheit 451’, de Ray Bradbury. O título é uma alusão à temperatura na qual o papel queima. Como desculpa, o capitão da corporação diz que os livros eram muito complexos. O aumento da população pede coisas mais rápidas, sucintas, fáceis de serem digeridas.

O país está em guerra, mas ela serve apenas como pano de fundo, pois a população não parece preocupada com a possível destruição. Há o consenso de que todos são felizes. ‘Eu trabalho e tenho lazer, pronto, é o que basta’. O questionamento é visto como comportamento antissocial. Quem vai por este caminho é eliminado. Por aí já dá para saber que estamos numa distopia. Este tipo de romance está, geralmente, relacionado ao controle social e à ficção científica. Há muitos elementos parecidos com o emblemático ‘1984’, de George Orwell e seu grande irmão.

O protagonista é o bombeiro Guy Montag. Ele faz seu trabalho sem pensar, como todos. Até que conhece uma garota que o faz refletir sobre sua atividade. Ela vem de uma família diferente. Seus pais, tios, isso mesmo, conversam. Pensam. Gostam de apreciar o que está ao redor. As famílias ‘normais’ são como a de Montag. Sua esposa, Mildred, vive imersa na realidade artificial. O mundo resume-se aos programas projetados nas telas que eles têm na sala. Os ouvidos também são literalmente tampados com uma espécie de fone de ouvido, as tais radioconchas,‘rádios firmemente ajustados, e um oceano eletrônico de som, música e vozes, música e vozes’. Tudo é entregue do jeito que as pessoas devem e podem absorver. Nada além, nada aquém.

Lembrou-me bastante “Assim falou Zaratustra”, de Nietzsche, “todos querem o mesmo, todos são iguais; e quem sente de outro modo vai, voluntário, para o manicômio”. Lá todos também são ‘felizes’. Já possuem tudo o que precisam. E quando confrontados, apenas ‘piscam o olho’, sem entender o que acontece. Da mesma forma, piscam os olhos os personagens de Bradbury. Montag surge como o ‘super homem’. Contrariando a ordem, ele esconde alguns livros, que serão farejados pelo Sabujo, o cão robô farejador. A partir daí, resta o refúgio junto com os demais ‘malucos’.

O livro, escrito em 1953, é uma projeção do que seria a década de 1990. No posfácio, o autor comenta sobre o processo criativo, que começou com o conto ‘Bright Phoenix’, evoluiu para o livro e culminou com a adaptação para o teatro. No último, ele reviu e detalhou melhor algumas situações. O romance foi ainda para o cinema sob direção de François Truffaut. Tudo muito atual. Tudo muito presente na nossa sociedade. Enfim, vamos colocar nossas ‘radioconchas’ e cantar, com todo mundo, a música do dia.

sexta-feira, 4 de julho de 2014

a vida do livreiro a. j. fikry

“A maior parte dos problemas das pessoas seria resolvida se dessem mais chances às coisas.” 

Eu me apaixonei pela cidadezinha de “A Vida do Livreiro A. J. Fikry”, romance da norte-americana Gabrielle Zevin. Fiquei com vontade de ficar lá, perdida neste lugarejo no qual só conseguimos chegar com dois trens e um barco. Isso quando não é inverno e as águas estão congeladas. E é neste fim de mundo que mora o livreiro do título. A esposa, que foi escritora, morreu num acidente de carro. Juntos abriram a Island Book, única livraria da remota Alice Island. Amargurado pela perda, tem fama de ranzinza. Logo no início, trata muito mal a representante que lhe traz as novidades do catálogo da editora para a qual trabalha. Despeja nela os tipos de livros dos quais foge. Ou seja, praticamente todos. Só se interessa por clássicos e bons contos. A coitada sai cambaleando. Mas tudo muda quando depois de beber até desmaiar, deixa à vista seu raro exemplar de ‘Tamerlane and other poems’, de Edgar Allan Poe. Embora não seja colecionador, o que detesta, conseguiu o livro em um destes ‘família vende tudo’. Guarda-o para quando decidir ter outra vida. Mas o livro some. A partir daí sua rotina e humor mudam. Ele faz amizade com o delegado Lambiase, ganha uma filha, a Maya, e passa a considerar Amelia, a maltratada representante, além dos títulos que ela apresenta. Fikry, mesmo quando é mal-humorado, nos rende boas risadas. Embora não seja pseudointelectual, finge ter lido os sete volumes de ‘Em busca do tempo perdido’, de Proust. Ele também gosta de correr. Em determinado momento, por não saber o que fazer com as chaves de casa na hora da corrida, resolve simplesmente deixar a porta aberta. Quem corre, vai entender o transtorno que esse objeto pode causar na hora do exercício. O livro é recheado de referências literárias, sobretudo de contos. A cada abertura de capítulo, nova sugestão, que sempre está associada ao momento dos personagens. Para ser lido sem interrupções, de preferência no inverno com tardes ensolaradas.

As capas nos Estados Unidos e na Inglaterra

segunda-feira, 23 de junho de 2014

te pego na saída

Este é o segundo volume das memórias de Fabrício Carpinejar. Mais que sua autobiografia, é o retrato da infância de todos aqueles que hoje têm entre 30 e 45 anos. Aliás, acredito que esta seja a proposta do autor. O texto é bem conciso e não segue a linha tempo. São as lembranças que ditam a ordem em que os capítulos estão dispostos. Destaco alguns episódios de ‘Te pego na saída’. Um deles é a doce narrativa sob o título ‘Encadernado pela imaginação’. Ao contrário das outras crianças da escola, ele não tinha cadernos de capa dura. Os seus eram de brochura, cuidadosamente encapados pela mãe, durante a madrugada, na véspera do início das aulas. Envergonhado, cobria-os com a mão para que os demais não os vissem. O que poderia ser motivo de chacota, hoje é poesia. E como não deve ter se sentido a criança que cria grande expectativa em torno de sua primeira festa de aniversário para, no fim, ninguém aparecer? O episódio me remeteu ao protagonista de 'O oceano no fim do caminho', de Neil Gaiman. Outro ponto com o qual me identifiquei foi a história do abacateiro, que morre para dar lugar ao novo quarto da casa. Só quem já teve uma árvore vai entender. Quase fechando suas lembranças, Carpinejar fala sobre os irmãos caçulas: os mais apegados à família e os que estão sempre ali, prontos a ajudar. Talvez por minha irmã mais nova ser assim, fiquei contagiada pelo o que foi colocado.  

Na resenha que escrevi sobre o primeiro livro da série, ‘Não atravesso a rua sozinho’, dou mais detalhes sobre essa coletânea, muito bem chamada de 'Vida em pedaços'. Imperdível para os nostálgicos de plantão.

domingo, 22 de junho de 2014

o xale


"O xale" é a reunião de dois textos da norte-americana Cynthia Ozick: o que deu nome ao livro e 'Rosa'. Eles foram publicados no começo dos anos 80 na revista The New Yorker. Embora tenham sido divulgados em separado, eles se completam. Falam sobre o nazismo, o holocausto dos judeus e a dificuldade de seguir adiante. No primeiro, Rosa, uma jovem mãe, usa seu xale para proteger a filha do inverno polonês. Com a menina no colo e a sobrinha ao lado, segue a fila rumo ao campo de concentração. Em seus delírios, o tecido é mágico, capaz de alimentar a criança. Até que ele é roubado, deixando a menina na mira dos nazistas. Na segunda narrativa, mais de trinta anos se passam e Rosa está nos Estados Unidos, ainda agarrada ao xale, símbolo de sua última esperança, e ao passado que antecede à captura de sua família. 

O tema já rendeu diversos livros e filmes. O que difere os textos de Cynthia Ozick é o depois, muito depois da guerra. Rosa sobreviveu, mas não quer ser vista como alguém que escapou. Porque, para ela, ainda está presa. "Pra mim, só existe um tempo; não existe depois", diz ao fugir de qualquer aproximação e conversa 'fiada' que tenta mostrar que ela precisa esquecer, aproveitar a vida. Difícil ler o livro sem me lembrar das cenas de "A vida é bela", minha referência para o cenário da primeira narrativa. A capa do livro traz o arame farpado que vai mostrar que Rosa pode estar certa. O cárcere é perpétuo, afinal. "Sem uma vida, a pessoa vive onde elas podem. Se tudo que elas têm é pensamentos, é lá que elas vivem."

Trechos

"Rosa não sentia fome; sentia-se leve, não como quem está andando, mas como quem está desmaiada, em transe, sem sentidos, como quem já é uma anjo flutuante, alerta e vendo tudo, mas no ar, sem estar realmente ali, sem tocar a estrada."

"Repare também na palavra especial que eles usaram: sobrevivente. Aquilo era novidade. Desde que que não tivessem que dizer ser humano, para eles estava bom."

sábado, 21 de junho de 2014

misery

'Misery' (1987), de Stephen King, é a companhia perfeita para um dia nublado ou uma noite fria e chuvosa. O enredo é tenebroso, assim como boa parte da obra desse autor best-seller. Posso dizer que não tivesse ele escrito 'O Iluminado', que tenho que revisitar, eu diria que 'Angústia', como o livro chegou ao Brasil, é uma versão suave de 'Jogos Mortais', aquela série cinematográfica no qual as pessoas vão sendo exterminadas aos poucos, mas com alta dose de crueldade. #sóquenão. Além de nos prender com o suspense que gira em torno do sequestro do escritor Paul Sheldon por sua 'fã número um', Annie Wilkes, o livro nos mostra o processo criativo da escrita. Após sofrer um acidente de carro durante uma nevasca, Paul é resgatado por Annie, que logo reconhece o criador de Misery, protagonista de sua série de livros favorita. Leva-o para sua casa, que fica num local escondido no Colorado. Com as pernas esmagadas, é preso na cama e sua dor só é aliviada com o Novril, analgésico potente criado por King. Rapidamente, ele se vicia na droga, que se torna objeto de chantagem: tem que fazer tudo o que Annie quer para ganhar outro comprimido. E sua situação piora quando sua sequestradora termina de ler o último livro com Misery. Lá Paul mata a heroína e enfurece sua fã. Corpulenta, ela espanca o escritor sem se importar que seu corpo já esteja despedaçado. E esse é apenas o começo das agressões físicas e psicológicas que vai sofrer. Daí para frente teremos machado, serra elétrica, cortador de grama, churrasqueira e até espumante. A narrativa é tão viva que sentimos dor junto com ele. Contudo, o pior momento é quando a psicopata, nota máxima no quesito maldade, o faz queimar os manuscritos de seu novo livro que, claro, não traz Misery. Detalhe, eram os originais sem nenhuma outra cópia. E sob a mira do olhar enfurecido de sua algoz, o escritor é obrigado a escrever outro livro, que trará Misery de volta. O que ele não contava é que, mesmo naquele cenário macabro, iria se envolver com a história. Arriscando uma interpretação, eu diria que Annie representa o sofrimento necessário para que uma obra surja. "Para ser um escritor é preciso ter um pouco de talento, mas o único pré-requisito de verdade é a capacidade de lembrar a história de cada cicatriz", diz Paul ao divagar sobre seu ofício, os bloqueios, a êxtase quando a ideia nasce e a euforia com que vai colocando tudo no papel. 'Misery' vale pelo terror, para quem gosta, porém, vale muito mais pela aula que Stephen King nos dá sobre sua forma de conceber os textos. Fica aqui a principal dica: "a preguiça é a mãe de todos os vícios". E seguindo o destino dos best-sellers do autor, o livro foi para o cinema, em 1990, com o título 'Louca obsessão'.

Trecho

“Saíra para comprar um videocassete e voltara para casa com algo muito melhor. Ele tivera uma IDEIA! Tentar TER UMA IDEIA não era um processo tão nobre nem tão sublime — embora fosse tão misterioso e necessário — quanto o outro. Quando se está escrevendo um livro, quase sempre aparece um bloqueio em alguma parte, e não adianta querer ir adiante, a não ser que se tenha uma IDEIA. Quando precisava de alguma IDEIA, Paul geralmente vestia um casaco e saía para um passeio. Para ele, caminhar era um ótimo exercício, embora fosse também tedioso. Se não tivesse que sair em busca de uma IDEIA, Paul levava um livro. Quando não havia com quem conversar durante o passeio, o livro tornava-se uma necessidade. Mas quando era realmente preciso TER UMA IDEIA, o tédio estava para o bloqueio na história como a quimioterapia está para um sujeito canceroso.”

sexta-feira, 20 de junho de 2014

a raposa sombria

Logo nas primeiras páginas de 'A raposa sombria' somos levados ao rigoroso inverno da terra do gelo, a Islândia. E entramos sem pensar, encantados pela beleza da prosa de Sjón. Eu classificaria a história como um conto. Ele não é linear e chega a beirar o fantástico. Talvez sejam os devaneios do frio. Ou da alma gélida, quem sabe. No início, ou meio, como veremos mais para frente, um caçador está diante de uma raríssima raposa do ártico. Esperta, ela conhece todos os truques para se defender, o que inclui brincar com os sentidos do caçador. Com textos curtos, às vezes uma única frase por página, o islandês nos envolve com sua aurora boreal. A raposa surge como o peso do qual o caçador quer se livrar, seus pensamentos indesejados. Em outro ponto da neve, temos um homem que fecha um caixão, enquanto serve chá para um mensageiro. Não vou dizer mais nada para não estragar a beleza da narrativa, sobretudo quando surge a conexão entre essas duas partes. O autor, Sjón, escreveu com Björk e Lars von Trier a trilha de 'Dançando no Escuro', filme que faturou o Oscar de melhor canção em 2001. Aliás, recomendo a leitura com essa trilha tocando. E se puderem ler num dia bem frio, como eu fiz, melhor ainda. Está garantida uma leitura que mexerá muito com você.

Aurora boreal na Islândia

sábado, 31 de maio de 2014

projeto rosie

Dei tanta risada com este livro. Tudo bem que não é muito original (lembrou-me 'Forrest Gump' e 'O lado bom da vida') e tem lá sua taxa de previsibilidadade. Mas 'Projeto Rosie' foi uma excelente pedida para uma fase em que eu não estava muito concentrada. Este é o primeiro romance do neozelandês Graeme Simsion, que o concebeu durante um curso de escrita criativa. Logo que o vi, pensei: um chick-lit escrito por homem. Estava certa. O livro é uma típica comédia romântica. Encenado na Austrália, é narrado pelo protagonista, o professor de genética Don Tillman, musculoso, bonitão e esquisito. Extremamente metódico, sua agenda contempla minuto a minuto todas as suas atividades diárias. Pular ou gastar segundos a mais com qualquer uma delas é o fim para ele. Adota ainda a refeição padronizada, assim não precisa parar para pensar o que vai comer. Tem o prato certo para cada dia da semana. Tudo o que precisa fazer é comprar os mesmos ingredientes, nos mesmos lugares e seguir os mesmos passos para o preparo dos alimentos. No piloto automático, deixando a mente livre para se preocupar com outras coisas, como seus projetos acadêmicos. Confesso que fiquei tentada a ter tal rotina e economizar várias horas. Enfim, esse esquema prático e racional é transferido para o campo amoroso. Don, que tem 'apenas' dois amigos, resolve arrumar uma esposa. Todavia, encontrar alguém, namorar e tudo mais leva..., claro, tempo. E com chances altas de descobrir, lá na frente, que aquela não é a pessoa. Para evitar que sua busca seja frustrada, ele elabora um minuncioso questionário, no qual elenca tudo o que espera da futura mulher. Vale ressaltar que Don tem uma memória super poderosa, consegue armazenar no seu cérebro dados, nomes, rostos como ninguém. A linguagem para ele também é sempre literal, direta e objetiva. Isso significa que não consegue disfarçar, mentir ou deixar de falar o que pensa. Antes dele, descobrimos que um de seus objetos de estudo genético o envolve. Será que vai dar certo? Bem, você, pelo menos, vai se divertir ;-)

Trechos

"Durante toda a minha vida fui criticado pela minha suposta falta de emoções, como se isso fosse um defeito absoluto."

"Descobri que as viagens longas de carro exerciam em minha mente um efeito semelhante ao das minhas corridas na feira. Pesquisas mostram que a criatividade aumenta quando se está executando tarefas absolutamente mecânicas, como correr, cozinhar e dirigir. Tempo desimpedido para pensar é sempre útil."

"Estaria ela perguntando pelo marido ou pelo filho falecido há tanto tempo? Houve uma época em que eu teria respondido sem pensar: 'Eles morreram'. Não por maldade, mas porque estou programado para reagir aos fatos e não aos sentimentos dos outros. Alguma coisa, porém, tinha mudado dentro de mim, e consegui suprimir essa afirmação."

quinta-feira, 8 de maio de 2014

divórcio


Como se recuperar de um divórcio? Que tal escrever um livro no qual destrói a imagem da ex?

Divórcio”, do brasileiro Ricardo Lísias, é mais ou menos assim: após quatro meses de casamento, o narrador protagonista, o próprio Ricardo Lísias, descobre o diário da esposa. Sem pestanejar, lê tudo e encontra o que jamais gostaria de ver: ela diz que é casada com um babaca. Alguém que só pensa em ler e que da vida mesmo não sabe nada. Alguém que não gosta de aventura. Que não a leva a lugares nos quais possa usar seus lindos vestidos. Que tem amigos sem expressão que mal sabem usar o garfo num restaurante. A esposa, segundo o romance, é uma famosa jornalista cultural. O marido descobre ainda que foi traído com apenas quarenta dias de casamento. O amante é um cineasta que ela havia entrevistado durante o Festival de Cannes.

Arrasado, ele sai de casa e vai morar no ‘cafofo’, galpão alugado para guardar seus mais de 12 mil livros. A partir daí temos a descrição que será fácil de entender por quem já sentiu dores de amor. O rapaz sente-se sem pele, como se estivesse em carne viva. Tudo dói. Até respirar torna-se difícil. Ele anda pelas ruas totalmente atordoado. Sem ouvir ou ver o que está ao seu redor. Seu passatempo é mandar várias mensagem para a ex e o advogado recém-contrato para tratar do divórcio. Ora agredindo. Ora pedindo para voltar para casa. Ora sem se lembrar do que fez.

E o que vai ajudá-lo é a corrida. Como já tinha o hábito de andar bastante (mania deveras criticada pela esposa no tal diário) fica fácil estabelecer a rotina de treinos, sempre após a meia-noite.

A esposa é apontada como insensível, interesseira, que não mede esforços para conseguir o que quer. Lísias se aproveita dessa percepção para criticar os jornalistas, a elite, a indústria do entretenimento e os clichês sociais (comprar casa própria, guardar dinheiro, visitar pontos turísticos). Reflexos da rejeição. O livro é dividido em 15 capítulos, que são os quilômetros da São Silvestre, prova que vai representar sua recuperação. Nos quilômetros finais, a leitura fica arrastada e repetitiva, com justificativas para o livro, mais críticas e comentários sobre outros contos e romances que escreveu. Cansa. Interessante é a brincadeira que o autor faz com o protagonista, que leva o seu nome. Isso nos deixa a pensar se estamos diante de um romance autobiográfico ou de ficção. Ou se é um mistura dos dois. No fim, não importa. Afinal, imaginar também pode ser uma experiência real.
 Talvez isso explique a certeza que ele tem de que é inocente, a vítima e o super bacana da relação desastrosa. "Acorda pra vida, seu mala", da vontade de gritar. Só não sei para qual dos dois.


“Logo depois do divórcio, um dos meus maiores problemas foi o ar. Na rua, respirava fundo e o fôlego não atravessava a garganta. Achei que, caminhando rapidamente, meu tórax se comprimiria um pouco. Fiz força, mas não deu certo. Voltou-me à cabeça o meu cadáver no cafofo. Olhei ao redor. Se morri, não posso estar vendo essas luzes. Alguns carros diminuíam a velocidade, outros paravam apenas no farol. O ar desapareceu de novo e acelerei ainda mais. Senti tontura. Se caísse, ninguém perceberia. Ninguém, uma palavra que ecoaria na minha cabeça com mais frequência que a imagem do meu corpo sem pele no caixão do cafofo. Quem pensa sem ar: ninguém, por exemplo. Você pode chorar desesperadamente na avenida mais importante da América Latina. Ninguém vai te ajudar. Ninguém me perguntou nada quando entrei na linha errada do metrô e olhei confuso para o letreiro.”

sexta-feira, 2 de maio de 2014

o físico

Está aí um livro que quase deixo para lá nas primeiras páginas. A leitura seguia arrastada. Felizmente, insisti e me deparei com uma história que me conquistou. 

"O físico", de Noah Gordon, vai agradar sobretudo aos amantes da Idade Média. De carona com o garoto órfão Rob J. Cole, somos levados a um passeio pelo século XI e pelos primórdios da medicina, já que personagens fictícios se misturam com reais.

Rob tem dez anos. E, numa sucessão de desgraças, perde os pais e se separa dos irmãos. Acaba sendo 'contratado' como assistente do cirugião-barbeiro Henry Croft, conhecido como Barber. Com seu novo tutor, aprende malabarismos e a curar certas enfermidades. Naquela época, médicos eram raros e cabia a esses profissionais saltimbancos, que sempre se formavam olhando uns aos outros, assistir os mais pobres. Após os shows que realizavam, tratavam de dores diversas, feridas, amputavam e também vendiam placebo. Aliás, o maior faturamento vinha das misturas de urina com aguardente, o tal Específico Universal, que sempre chocou Rob, e que supostamente era infálivel para todos os males do corpo. E assim, com a carroça colorida percorriam todas as cidades inglesas, animando e exercendo a medicina tanto quando podiam. Como diferencial contavam ainda com o dom de Rob, que sabia se o doente iria morrer apenas segurando suas mãos. Sensibilidade que não podia ser tão exposta, haja vista a Inquisição, que não hesitava em queimar todos que apresentavam qualquer indício de feitiçaria. 

Mas o que mais me fascinou é o que veio depois. Rob resolve ser médico de verdade. E as melhores escolas ficavam longe, no oriente. Inacessíveis para um pobre cristão. Mesmo diante das adversistades, ele mostra-se determinado a conquistar o tal diploma e parte para a Pérsia, disfarçado de judeu. Em sua jornada, conhecemos as caravanas que cruzavam continentes e o encontro das culturas cristã, judaíca e islã. Aprendemos sobre os primeiros modelos de hospital. Somos apresentados ao jogo do Xá (monarca persa), versão antiga do xadrez. Roubamos elefantes na Índia (os animais sempre foram vítimas do homem. Não sei se sofriam mais antes ou agora com a indústria alimentícia. Enfim. Pelo menos, Rob os respeitava). Participamos do chatir, corrida de 126 milhas romanas, que marca o fim do ramadan. Pelas minhas contas e pesquisas rápidas, algo em torno de 180 quilômetros. Uma ultramaratona. Gostei muito desse trecho. O treino do atleta, sua ansiedade, vontade de terminar a prova com suas mais de 12 horas. A torcida. Inclusive, neste ponto dei uma pausa e fui eu mesma correr minhas seis milhas romanas ;-)

O romance traz ainda paixões, mortes, batalhas, triações e tudo mais o que pede uma boa epopeia. Vale muito, muito a leitura. Já estou com saudades dos personagens. 

Trechos

“Antes do anoitecer acamparam em uma colina, ao lado de um regato. O homem disse que o nome do cavalo cinzento pintado era Tatus - Abreviação de Incitatus, o nome do cavalo que o imperador Caligula amava tanto a ponto de fazer do animal um sacerdote e um cônsul. Nosso Incitatus é um animal razoavelmente bom para um coitado com os sacos cortados - Barber disse, mostrando como cuidar do cavalo, esfregando no animal punhados de relva macia e cinzenta, depois fazendo-o beber e começar a pastar antes de cuidarem deles mesmos.”

“O chatir é nossa corrida nacional, realizada todos os anos e quase tão antiga quanto a Pérsia - disse Karim - Comemora o fim do ramadan, o mês de jejum religioso. Originalmente - tão distante nas brumas do tempo que perdemos o nome do rei que patrocinou a primeira corrida - era uma competição para escolher o chatir do Xá, ou escudeiro, mas através dos séculos passou a atrair para Ispahan os melhores corredores da Pérsia e de outros lugares e adquiriu a característica de grande espetáculo.”