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domingo, 3 de agosto de 2014

a festa da insignificância

"A insignificância, meu amigo, é a essência da existência."

De Milan Kundera, eu li “A insustentável leveza do ser”, livro que foi para a tela dos cinemas numa linda adaptação com Juliette Binoche no papel principal. Por aqui, houve certo furor em torno do seu novo romance, já que o autor tcheco, que agora escreve em francês, ficou mais de dez anos sem lançar nada. “A festa da insignificância” é como um bate-papo entre amigos num fim de tarde. Tem o frescor da primavera. Recomendo que seja apreciado com um vinho branco gelado. Ou talvez com um armanhaque, tal e qual o adquirido por Rámon, um dos amigos que protagonizam a história. 

Tudo começa com Alain caminhando pelas ruas parisienses refletindo sobre o umbigo exposto das moças. Ele não consegue entender o porquê desta parte ter se tornado objeto de desejo, lugar que já foi dos seios, das coxa e da bunda. Sua conclusão é que a massificação imperou definitivamente, já que todos os umbigos são iguais, ao contrário das demais partes citadas. É o fim da individualidade. Esta é uma entre tantas metáforas para tratar da insignificância da vida e de muitas coisas na quais acreditamos e pelas quais brigamos. Enquanto divaga sobre as formas de sedução feminina, no mesmo instante e nas proximidades do Jardim de Luxemburgo, Ramón tenta em vão assistir à exposição do artista expressionista russo Marc Chagall. Mas desanima-se com a fila. Nisso encontra um velho conhecido que acaba de receber o resultado de seu exame: não está com câncer. Algum motivo, contudo, o impele a dizer que, sim, está doente. Daí temos o convite para sua festa de aniversário e o encontro com os outros dois amigos, Charles e Calibã. Com eles vamos refletir sobre os motivos que nos levam a viver, a fingir, a querer e a morrer. "As pessoas não podem se atirar umas sobre as outras sempre que se encontram. Em vez disso, tentam jogar no outro o constrangimento da culpabilidade. Ganhará aquele que conseguir tornar o outro culpado", pensa um deles enquanto tenta entender seus próprios dilemas. Observadores, não deixam escapar nada, nem mesmo os que se escondem. "O silêncio chama a atenção. Pode impressionar. Te tornar enigmático. Ou suspeito."
Um dos pontos altos do livro são as conversas imaginárias com a mãe desaparecida de um deles e do ditador russo Stálin com seus subalternos. Só me fez querer mais deste autor. Só me fez querer caminhar sem compromisso, com pensamentos soltos, pelas ruas e parques de capital francesa.

Mais que um parque
"Lá, a atmosfera estava mais agradável; o gênero humano parecia menos numerosos e mais livre: havia os que corriam, não porque estivessem apressados, mas porque gostavam de correr; havia os que passeavam e tomavam sorvete; havia no gramado discípulos de uma escola asiática que faziam movimentos bizarros e lentos; mais adiante, no imenso círculo, havia grandes estátuas brancas de rainhas e de outras nobres damas da França, e, ainda mais adiante, no gramado entre as árvores, em todas as direções do parque, esculturas de poetas, de pintores, de sábios."

Jardim de Luxemburgo, cenário do livro