Páginas

Mostrando postagens com marcador josé saramago. Mostrar todas as postagens
Mostrando postagens com marcador josé saramago. Mostrar todas as postagens

quinta-feira, 18 de setembro de 2014

os dez livros mais marcantes


Fui convidada no Facebook a dizer quais são os dez livros que mais me marcaram. Embora possa mudar a qualquer instante, eis a minha lista:

Memorial do Convento, de José Saramago: a história de amor de Baltazar e Blimunda, sete-sóis e sete-luas, é linda. Sem contar a simbologia por trás da dupla e demais personagens. Aliás, vou encaixar aqui outros dois livros de Saramago: 'As intermitências da morte' e 'Ensaio sobre a cegueira'. Todos hilários e muito inteligentes.

Intérprete dos Males, de Jhumpa Lahiri: sou apaixonada pela Índia. E esse livro só aumentou minha afeição por tudo o que vem desse país. São vários contos que mexem com nossos sentimentos.

A insustentável leveza do ser, de Milan Kundera: o que é o amor, afinal? Talvez esse livro possa dar algumas pistas. A versão para o cinema ficou muito boa também. Outro romance que vai nesta linha é 'Travessuras da menina má', de Mario Vargas Llosa. Deveras bom também. 

O mundo de Sofia, de Jostein Gaarder: acredito no poder do young adult (YA) para incentivar a leitura. Está aí um dos livros que li na adolescência e que ainda hoje tem seus reflexos.

Melancia, de Marian Keyes: meu primeiro chick-lit. Veio em boa hora e me ajudou a transformar lágrimas em risos.

1984, de George Orwell: será que não vivemos isso? Essa foi a pergunta que fiz nas duas vezes que li o livro, num intervalo de 15 anos entre uma leitura e outra. Aposto que ainda continua atual.

O processo, de Franz Kafka: sabe aqueles sonhos e pesadelos malucos que temos? Pois Kafka soube transformá-los em literatura. Incluo ainda aqui 'A metamorfose'.

O morro dos ventos uivantes, de Emily Brontë: tem o trecho de livro que mais gosto. Algo assim: amo tanto meu pai que gostaria que ele morresse primeiro. Assim, eu lidarei com sua morte e não ele com a minha (...)

Crime e castigo, de Fiódor Dostoiévski: quem nunca se sentiu culpado? Talvez não por um assassinato, espero, mas todos nós temos que lidar com dúvidas sobre nossos atos. Romance que vai fundo na consciência do personagem. Chegamos a sentir sua aflição.

Música ao Longe, de Erico Verissimo: o primeiro romance que li. Tinha uns 10 anos. Com a professora Clarissa, a protagonista, comecei a escrever num diário. Mesmo com o fundo político, o livro é leve e nos deixa com aquele ar sonhador. Antes de Música ao Longe, Verissimo escreveu o romance 'Clarissa', que mostra a adolescência dessa mesma personagem. Após, veio 'Um Lugar ao Sol', que encerra, vamos dizer assim, a 'trilogia Clarissa'. Todos inesquecíveis, sobretudo os dois primeiros. E já inclui vários livros, vai mais um aqui do mesmo autor: 'Olhai os lírios do campo'.

Desafio todos que passarem por aqui a elencarem suas leituras mais marcantes também ;-)

terça-feira, 12 de março de 2013

as pequenas memórias

Em “As pequenas memórias”, José Saramago nos conta um pouco sobre sua infância. É como se fosse um bate-papo no qual uma lembrança vai puxando outra. Lê-lo é como se ouvíssemos seu forte sotaque português. No meu caso, é como se eu me transportasse para a infância e adolescência, quando ouvia as histórias dos meus avós paternos que vieram de Portugal.

O autor aparece engraçado e irônico como sempre. Mas às vezes com detalhes muito particulares. Ficamos a nos questionar sobre quem, ou o que, estaria ele a falar agora. Começa o relato lamentado as mudanças na sua aldeia natal Azinhaga, antes uma terra de oliveiras, hoje tomada por um campo de milho híbrido, “com a mesma altura, talvez com o mesmo número de folhas nas canoilas, e amanhã talvez com a mesma disposição e o mesmo número de maçarocas, e cada maçaroca talvez com o mesmo número de bagos.” 

Fala das brincadeiras da época em que era menino, das brigas com os primos, das férias na casa dos avós, do excelente e exemplar aluno que foi desde que começou a aprender o “a e i o u”. Os primeiros namoricos e o fora que deu numa garota apenas porque o apelido dela era Bacalhau, “eu, pelos vistos já sensível aos sons e aos sentidos das palavras, não queria que mulher minha fosse pela vida carregando com o nome de Deolinda Bacalhau Saramago.” 

Por falar em nome, Saramago não é de fato seu sobrenome. Foi sem muita explicação inserido pelo escrivão que o registrou. Seu pai era um Sousa e só descobriu o incidente muito tempo depois. E para tentar concertar o que não tinha concerto, mudou ele próprio seu nome. Para Saramago o único caso em que o filho deu o nome ao pai. 

A ideia de escrever suas primeiras lembranças veio quando trabalha em “Memorial do Convento”, no início da década de 1980. Primeiramente denominado “O livro das tentações”, ganhou outro título e foi lançado quando tinha 84 anos. Tentações talvez sejam as memórias que insistem em aparecer, mesmo quando a queremos bem longe. Ou quando revisitamos momentos especiais que nunca mais teremos de volta. Mas como ele adianta, o negócio é se conformar, pois “também inutilmente se chorará o azeite derramado.” Leitura obrigatória para quem admira e se diverte com seus livros.


“Dizem os entendidos que a aldeia nasceu e cresceu ao longo de uma vereda, de uma azinhaga, termo que vem de uma palavra árabe, as-zinaik, ‘rua estreita’, o que em sentido literal não poderia ter sido naqueles começos, pois uma rua, seja estreita, seja larga, sempre será uma rua, ao passo que uma vereda nunca será mais que um atalho, um desvio para chegar mais depressa aonde se pretende, e em geral sem outro futuro nem medidas ambições de distância.” 

“A criança que eu fui não viu a paisagem tal como o adulto em que se tornou seria tentado a imaginá-la desde a sua altura de homem. A criança, durante o tempo que o foi, estava simplesmente na paisagem, fazia parte dela, não a interrogava, não dizia nem pensava, por estas ou outras palavras: “Que bela paisagem, que magnífico panorama, que deslumbrante ponto de vista!”

terça-feira, 10 de abril de 2012

as intermitências da morte

Há quem diga que precisamos sempre pensar na morte. Já que vamos morrer, temos que aproveitar bem os "últimos dias". Logo me lembro da música de Assis Valente “E o mundo não se acabou”, que diz: “Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar... Acreditei nessa conversa mole... E sem demora fui tratando de aproveitar. Beijei na boca de quem não devia. Peguei na mão de quem não conhecia.” E para desespero de todos, “o tal do mundo não se acabou.”

Em “As Intermitências da Morte”, do escritor português José Saramago, não foi o mundo que “não se acabou”, mas a morte que não chegou. Motivo: cansou de ser odiada pelos humanos e resolveu mostrar o quanto é importante. Logo no primeiro parágrafo do livro, Saramago nos explica a situação:

“No dia seguinte ninguém morreu.”

“Passar-se um dia completo, com todas as suas pródigas vinte e quatro horas, contadas entre diurnas e nocturnas, matutinas e vespertinas, sem que tivesse sucedido um falecimento por doença, uma queda mortal, um suicídio levado a bom fim, nada de nada, pela palavra nada. Nem sequer um daqueles acidentes de automóvel tão frequentes em ocasiões festivas, quando a alegre irresponsabilidade e o excesso de álcool se desafiam mutuamente nas estradas para decidir sobre quem vai conseguir chegar à morte em primeiro lugar.”

Todos celebram num ímpeto. Afinal, sobrevivem a acidentes, doenças crônicas e demais males que teriam levado o cidadão desta para melhor. Contudo, o que parecia ser uma dádiva, passa a incomodar. Os enfermos se multiplicam, lotam hospitais, estorvam os familiares e, claro, sofrem. Como não há morte, a dor torna-se eterna.

Governo e igreja confabulam. Enquanto uns pensam no que será feito da previdência social, outros discutem que não há mais vida após a morte. Assim sendo, qual seria a razão da religião? Filósofos e economistas também lançam seus pensamentos diante da grave situação. Enquanto isso, as funerárias padecem com o desaparecimento de seu público-alvo.

Passado algum tempo, descobre-se que a greve atinge apenas aquele país. Do outro lado da fronteira, é possível morrer. É só atravessá-la para que a pessoa possa, enfim, descansar em paz. Como tudo o que é fácil pode ser complicado, a burocracia dificulta a vida (ou morte) dos moribundos. Eis que surgem as brechas, os oportunistas e a máfia, que passa a dominar o esquema da travessia. Neste trecho temos grande ironia de Saramago em relação à política e à sociedade. Aliás, como em todas as suas obras, há trechos hilariantes. Você “morre de tanto rir”.

Do outro lado, a morte assiste a tudo de camarote. Até que muda de estratégia e pede para que uma carta sua seja lida em rede nacional de televisão. O país para e ouve o que ela tem a dizer. O que ela não previu é que se apaixonaria por um humano. E ninguém morre enquanto a morte sofre por amor. Li o livro há mais de seis anos, mas ele ainda está muito presente na minha mente. Imperdível.




E o mundo não se acabou, na voz de Adriana Calcanhotto