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sábado, 31 de agosto de 2013

o melhor lugar do mundo é aqui

Ao ver "O melhor lugar do mundo é aqui" na livraria, fiquei namorando a capa sem me atentar ao autor, ou melhor, aos autores: Francesc Miralles e Care Santos. Dele eu havia lido "Amor em minúsculas". E este foi o estopim para eu levar o livro para casa. Se bem que eu o teria levado de qualquer forma. Foi lançado na Espanha em 2008, mas só agora chegou ao Brasil.

O romance, lido em poucas horas, é delicioso. Os ingredientes são os mesmos do anterior: uma pessoa sozinha, sem muitas perspectivas que encontra outras que vão dar sentido às suas escolhas, além da adoção de um bichinho de estimação que vai tornar a vida mais animada. Lá era um gato, aqui um cachorro.  Lá era um homem, aqui é uma mulher, Iris. Ela tem 36 anos e acabou de perder os pais num acidente de carro. Após mais um almoço de domingo sem companhia e nenhum sonho que a estimule, decide acabar com a própria vida na linha do trem. "Estava prestes a fechar os olhos para aceitar a queda quando um estalido às suas costas a deteve de repente." Era um garoto de seis anos estourando uma bexiga.

Agradecida por continuar a viver, ela depara-se com um café que nunca tinha visto antes. O letreiro luminoso piscava "O melhor lugar do mundo é aqui." Curiosa, entra no estabelecimento e conhece Luca, com que passa a se encontrar todos os dias naquele local. Sempre em mesas diferentes, cada uma com sua magia e mensagem a ser decifrada. A paixão, o sorriso nos lábios e a lista do que fazer antes de morrer são inevitáveis. Com pitadas de fantasia, a leitura é envolvente. Além de nos mostrar a beleza dos haicais, poemas japoneses que reverenciam a objetividade e o presente. O texto tem ainda trilha sonora, entre as músicas selecionadas, The end, dos Beatles, e I am your man, de Leonard Cohen. Leiam, ouçam e não deem importância se algo parecer absurdo. "Nunca deixe que a realidade estrague uma boa história."

"O rouxinol
uns dias não vem,
outros vem duas vezes"



Anúncio que levou a personagem a adotar um cachorro.
 Ele trouxe à tona um momento inesquecível de sua adolescência

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quinta-feira, 29 de agosto de 2013

a árvore generosa

Este lindo livro, do norte-americano Shel Silverstein, chamou minha atenção pelo título: "A árvore generosa". Voltado ao público infantil, foi escrito na década de sessenta e chegou ao Brasil com tradução de Fernando Sabino. Comecei a folheá-lo e fiquei encantada com a doçura do texto. As ilustrações com traços simples, feitas pelo próprio autor, ajudam a tornar a história ainda mais comovente e próxima. Diria que os adultos vão se emocionar ainda mais que as crianças. Ao falar da amizade de um garoto com uma árvore, traz à tona os nossos próprios relacionamentos e como é preciso pouco para cultivar os que são realmente importantes. E como é fácil fazer feliz quem nos ama. O livro começa assim: "Era uma vez uma árvore que amava um menino. E todos os dias o menino vinha, juntava suas folhas e com ela fazia coras de rei; com elas brincava de rei da floresta." Existia a reciprocidade. "O menino amava a árvore profundamente. E a árvore era feliz. Mas o tempo passou." Será que o passar dos anos pode apagar o amor? Leiam e tirem suas próprias conclusões.
 

Vejam também "A árvore e a casa", texto que fala sobre uma árvore especial: http://www.livrosemotivos.com.br/2013/05/a-casa-com-uma-arvore.html

E para quem quiser reviver a infância, recomendo ainda a leitura de "O oceano no fim do caminho", de Neil Gaiman: http://www.livrosemotivos.com.br/2013/08/o-oceano-no-fim-do-caminho.html



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terça-feira, 27 de agosto de 2013

o oceano no fim do caminho


Quem aqui já teve sete anos e muita imaginação? Pois este livro é para você. Vai soar meio lugar-comum, mas a verdade é que eu me identifiquei muito com o universo fantástico apresentado por Neil Gaiman em “O oceano é o fim do caminho”. Nunca tinha lido nada do autor, nem mesmo sua famosa HQ “Sandman”, que está na lista agora. Apesar de o título e a capa sugerirem auto-ajuda, aqui não tem nada disso.
Tida como autobiográfica, a história começa com um homem de quarenta e tantos anos que retorna ao lugar em que passou sua infância para um velório, em Sussex, Inglaterra. A casa em que viveu nos primeiros anos não está mais lá, mas as lembranças de quando tinha sete anos surgem a partir do momento em que vai para o lago em que costumava brincar com a amiga Lettie. Aliás, o oceano do título, pois era assim que a garota o fazia acreditar serem aquelas águas. Esse personagem principal não tem nome. E toda a trama são resgastes de sua memória, do que aconteceu e das aventuras que ele imaginava ao lidar com eventos confusos para uma criança: sua festa de aniversário na qual ninguém foi, as dificuldades financeiras dos pais, o suicídio de um inquilino, a suposta infidelidade do pai e, o mais grave de todos, a morte do seu gatinho Fofinho. Para entender melhor tudo isso, ele, que era introspectivo e apaixonado por livros, fantasiava. E as angustias eram transformadas em vermes, pulgas, pássaros verozes querendo invadir o seu mundo. Agora, adulto e diante de mais um momento pesado, ele volta a se esconder em seu 'reino encantado'. Não vou falar mais nada. Leiam o livro como se tivessem sete anos, como se fosse possível destruir os problemas com a força da imaginação. Quem sabe ;-)
Assim imagino o cenário do livro

Fiquem com algumas frases

“Naquela noite, meu pai chegou do trabalho carregando uma caixa de papelão. Dentro havia um gatinho, um filhotinho de gênero indefinido com pelo preto e macio, a quem chamei logo de Fofinho, e que amei total e incondicionalmente.”
“Pessoas diferentes se lembram das coisas de jeitos diferentes, e você nunca vai ver duas pessoas se lembrando de uma coisa da mesma forma.”
“Fui para outro lugar em minha cabeça, para dentro de um livro. Era para onde eu ia sempre que a vida real ficava muito difícil ou muito inflexível.”
“Ninguém realmente se parece por fora com o que é de fato por dentro. Nem você. Nem eu.”
“Livros eram mais confiáveis que pessoas, de qualquer forma.”
“Não vai doer. Fiquei olhando para ele. Os adultos só diziam isso quando qualquer coisa ia doer muito.”

“Este é o problema com as coisas vivas. Não duram muito. Gatinhos num dia, gatos velhos no outro. E depois ficam só as lembranças. E as lembranças desvanecem e se confundem, viram borrões...”Deixe seu comentário e compartilhe suas leituras :-)

sábado, 24 de agosto de 2013

a distância entre nós

Imagine alguém que sofre muito. Bhima. Imagine alguém que teve todos os seus sonhos destruídos. Bhima. Imagine alguém que tem ódio da vida, mas que tem que continuar vivendo. Bhima. Se você acha que sua vida não é fácil, você ainda não conheceu Bhima, a protagonista de “A Distância Entre Nós”, da escritora indiana, que hoje vive nos Estados Unidos, Thrity Umrigar. 

Ela faz parte da geração de escritores indianos (ou filhos de indianos) que retratam o amor à família, promessas desfeitas e sonhos destruídos. E tudo com grande dose de inocência dos personagens, o que faz com que sejam doces e comoventes. 

Este romance não é diferente. Eu o vi na livraria logo que foi publicado no Brasil, em 2006, mas só recentemente o adquiri. Junto com Bhima no jogo de quem sofre mais está Sera, sua patroa. Enquanto uma enxuga as lágrimas em lençóis de seda, a outra as engole antes de entrar no barraco em que mora, em uma das favelas de Bombaim ou Mumbai, como preferirem.

Sera é filha de acadêmicos renomados e se casou com Feroz num arranjo que a agradou. Mas estava enganada. O marido era extremamente violento. Não demorou muito para receber o primeiro golpe. Orgulhosa, ela aguentava em silêncio cada pancada que recebia. Assim como tolerava as investidas negativas de sua sogra. Ou seja, seu sonho de família foi destruído nas primeiras semanas. Sua vida era um verdadeiro inferno, disfarçado pelas boas coisas que o dinheiro pode comprar.

Bhima, por sua vez, até que se deu bem no amor. Quero dizer, de certa forma. Linda a passagem que mostra como conheceu o seu Gopal e o que ele fez para conquistá-la: seguia todos os dias de bicicleta o ônibus que ela pegava, sempre com o sorriso no rosto e uma bela canção. Aqui não houve arranjos. Apenas promessas. E se essas não foram cumpridas foi culpa do destino, somente. Tiveram dois filhos e eram felizes. Até que Gopal sofre um acidente no trabalho. E Bhima é enganada e levada a assinar um acordo que nunca existiu. Começa aí seu ato de sofrimento contínuo. Gopal perde o emprego, a dignidade e entrega-se ao alcoolismo. Até que desaparece levando o caçula do casal. Mais tarde é a vez da filha ir embora, mas pelas mãos da Aids. Tudo nos é contado por meio de retrospectivas, não lineares, intercaladas com o presente.

No início do livro, Bhima imagina como seria fácil dar um chute na barriga de Maya, sua neta que dorme no chão, e acabar com mais uma sucessão de fracassos que a assola. Com apenas dezessete anos, a menina estava grávida. E assim destruiu o que poderia ser o último sonho da avó. Mas não pense que esta mulher é má. Apenas “está cansada de tudo, cansada desse ciclo incessante de nascimento e morte, cansada de investir qualquer esperança na próxima geração.”

Se buscam um romance com bastante sofrimento, fica aí a dica. Eu sou fã do gênero. Vejam outras sugestões no post a índia é bem mais perto do que parece.