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quarta-feira, 26 de novembro de 2014

o iluminado

Capa de uma das edições brasileiras.
Traz o quarto proibido: 217
Esperava mais. Foi com essa sensação que terminei a leitura de 'O iluminado', de Stephen King. Talvez o primeiro livro que eu li depois de assistir a sua adaptação cinematográfica, aliás, há muitos anos. Mas o filme me marcou tanto que ainda estava bem vivo na memória, sobretudo as cenas na neve.

O livro seguia bem até as últimas 20 páginas. Jack é professor e escritor que carece de inspiração (SK gosta de escritores em suas narrativas. Vide o excelente Misery). Tenta se curar do alcoolismo, doença que reforça seu temperamento agressivo. A impulsividade o levou a quebrar o bracinho do filho quando ele tinha apenas dois anos e a esmurrar um de seus alunos. Resultado: perdeu o emprego, ficou sem grana e teve que aceitar a única proposta que apareceu: ser zelador de um hotel nas montanhas do Colorado (EUA) durante o inverno. Ou seja, quando o local fica totalmente isolado por causa da neve. Mas o livro é de terror, suspense. E o Overlook é bem propício para deixar um ser humano perturbado ainda mais louco. Danny é o filho. Tem cinco anos e é iluminado. Ele vê coisas. Tem premonições. Seu melhor amigo é imaginário e, por muitos momentos, é muito adulto para a idade. A esposa é a Wendy, mulher sem iniciativa que ainda acredita na recuperação do marido. Os três vão para o hotel.

Assim que chegam, as alucinações começam. O menino vendo pessoas mortas. O pai ouvindo vozes. E a mãe ainda acreditando na salvação da família. Eu pensei que sentiria mais medo. Até procurei ler durante a noite para criar um clima. Mas, exceto por uma passagem na banheira (sempre ela), não deu certo. Os últimos lances com o tal baile que aconteceu por lá foram bem cansativos e piegas. Muito longe de amedrontar. Enfim, leiam sem sustos (rá!). Desta vez, fico com o filme, com o Kubrick e, claro, com o Jack Nicholson ;-)


Cartaz do filme de 1980

terça-feira, 25 de novembro de 2014

o irresistível café de cupcakes

Mais um chick-lit para minha lista. ‘O irresistível café de cupcakes’ é o livro de estreia da norte-americana Mary Simses. O título me fez lembrar 'My blueberry nights' (2007), belo filme estrelado por Norah Jones, e talvez por isso me rendi à leitura. Mas aqui os motivos são bem diferentes. Sem pretensão, conta uma história bonitinha e gostosa. Leitura para o fim da tarde durante as férias. O enredo é simples e previsível. Ellen tem 35 anos, é bem-sucedida profissionalmente e noiva de um bonitão da alta roda política. Para atender o último pedido da avó, vai parar numa cidadezinha litorânea. Lá descobre a simplicidade e o boa pinta Roy. Resultado: apaixona-se por tudo. E o noivo? Quem conhece este tipo de leitura, já deve imaginar o final. Mas vale pela descontração e pelo passeio por esta cidade do Maine, estado ao norte dos Estados Unidos. Fiquei morrendo de vontade de me perder por lá, nos campos de blueberry que são mencionados. Aliás, o site da autora traz imagens que nos transportam para o cenário que idealizou para seu livro. Outro ponto interessante da leitura é a seleção musical que Simses nos dá, e que embalam os pensamentos da protagonista. Ótimo para quem curte jazz, blues e country. Anotei todas e criei a playlist The Irresistible Blueberry Bakeshop & Café no Spotify. Ouçam e embarquem nesta viagem também :-)

Plantação de blueberry



A playlist :-)

segunda-feira, 24 de novembro de 2014

uma fábula

Peço licença para reproduzir a bela fábula do escritor mineiro Autran Dourado (1926-2012). Leiam com o coração :-)

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O pintassilgo
por Autran Dourado

Era uma vez um pintassilgo amantíssimo, capaz de dar a vida pelos seus filhotes. Um dia, trazendo no bico uma minhoca para eles, não os encontrou. Caindo no maior desespero, saiu a procurá-los pela floresta; os ninhos que ele encontrava estavam vazios. Vendo-o tão desesperado, disse um pardal que não adiantava procurá-los, pois os vira numa gaiola na janela da casa do proprietário da floresta.


Cheio de esperança, o pintassilgo voou para lá. Viu logo, numa gaiola dourada, os seus filhotes presos. Começou a bater o peito, o bico e a cabeça na grade da gaiola. Inutilmente, porque o arame da gaiola era muito grosso. Voltou para a floresta.


No dia seguinte estava de volta, trazendo no bico uma erva. A erva era venenosa e os filhotes morreram.

Moral da história: antes morrer do que ficar preso. Foi o que disse o pintassilgo.

domingo, 23 de novembro de 2014

timoleon vieta

O livro traz esta imagem várias vezes, 
 sempre com uma frase atribuída ao cão
'Por quê? Por quê?' Fiquei a perguntar a Dan Rhodes no fim da leitura do seu 'Timoleon Vieta volta para casa'. Se existe um livro do qual eu gostaria de mudar o desfecho, este é um deles. Mas para isso eu teria que mudar a humanidade.

Cockcroft é um inglês decadente que mora na Toscana. Ele vive dos direitos autorais dos jingles que compôs décadas antes. Está na casa dos sessenta anos e costuma hospedar rapazes bonitos em troca de favores sexuais. O problema é que ele se apega a eles e sofre a cada rompimento. E é o medo de ficar sozinho que o leva a cometer o ato mais cruel da sua vida. Ele também abriga o simpático Timoleon Vieta, cachorrinho preto com manchas brancas e caramelo. O livro começa dizendo que ele faz parte da melhor raça de cães, os vira-latas. Timoleon, que tem os olhos mais cativantes já vistos, apareceu durante um temporal na casa de Crockroft e por lá ficou, tornando-se seu melhor amigo e confidente. Durante cinco anos presencia vários casos amorosos do 'dono'. Como ele mesmo diz, os rapazes vão, o cachorro fica. Até que surge uma figura misteriosa que diz ser refugiado da Bósnia. O cachorro não o aprova. Mas com medo de perder seu Bósnio, Cockcroft acaba cedendo aos pedidos do novo companheiro, e abandona o cão nas ruas de Roma. 


Na tentativa de voltar para casa, e aqui temos certa analogia com 'Lassie volta para casa', de Eric Knight, o cão depara-se com diferentes pessoas. E nós passamos a conhecer a história de cada uma delas até o encontro com Timoleon. Tem a chinesinha que encontra o cão no velório do padastro. A moça do País de Gales que confessa seus amores perdidos nas fontes de Roma. A menina de Camboja que vê o cão pelas fotografias da irmã que se casou com um dentista francês. A muda que apaixona-se por um deliquente, entre outros. Na verdade, o cão é o motivo para os vários contos apresentados no romance. Podemos dizer que, em sua jornada, o cão que se apresenta como coadjuvante de outras vidas.





Confesso que a leitura me incomodou. Sobretudo pelo final. Fiquei pensando se não poderia ter sido diferente. Mas, afinal, o ser humano é mesmo assim: cruel, individualista e cheio de loucuras que machucam. Fica o exemplo do afeto dado pelo cachorro. Timoleon Vieta só aumentou o meu amor pelos bichos :-)








quinta-feira, 13 de novembro de 2014

a cultura da participação


Conclui “A cultura da participação – Criatividade e Generosidade no mundo conectado”, de Clay Shirky, com a sensação de quero mais. E de que posso mais. No livro, o autor expõe as vantagens de estarmos conectados. Começa mostrando o que as pessoas fazem no tempo livre, que ficou maior depois da revolução industrial. Na Inglaterra, antes, bebiam gim. Depois, veio a TV e começamos a passar horas de nossas vidas diante da tela. Segundo ele, tempo perdido e não produtivo, já que a comunicação é de uma só via. Hoje, a rede social é a bola da vez. Conta que o ‘compartilhamento’ permite avanços sociais, tecnológicos, científicos, dentre outros. “Algo que torna a era atual notável é que podemos agora tratar o tempo livre como um bem social geral que pode ser aplicado a grandes projetos criados coletivamente, em vez de um conjunto de minutos individuais a serem aproveitados por uma pessoa de cada vez.”

Também derruba conceitos sobre as gerações baby boom, x, y, z etc. Na verdade, é tudo balela. A diferença está na ferramenta e não nos anseios ou comportamento dos jovens.

Isso me fez rever a opinião que tenho sobre o exibicionismo exacerbado nas redes sociais. “Quando eu era adolescente, não fazia isso”, penso. E o que Shirky comentaria? “Era, sim, só não tinha as ferramentas para tal.” Bem, lembrei do 'Caderno de Recordação' que toda menina tinha e que passava de mãos em mãos solicitando um depoimento a nosso respeito. Idem para a 'Enquete', caderno que trazia em suas páginas questões a serem respondidas pelos amigos. Não eram on-line, mas compartilhavam. No fundo, queríamos que outros lessem as boas impressões a nosso respeito.

E a internet surge como o grande avanço para atiçar ainda mais o desejo de trocar informações, sempre por meio de interesses comuns. É a lógica do ‘publicar’. Se antes precisávamos de alguém que ‘autorizasse’ o envio de uma mensagem nossa para a grande massa, hoje isso não é mais necessário. Vejam o cyberativismo e suas decorrentes manifestações nas ruas. Isso porque, e o autor é bem enfático neste ponto, pessoas com os mesmos objetivos se unem e, juntas, elas conseguem encontrar as soluções para seus problemas. O que não aconteceria se agissem sozinhas. Isso vale desde uma reinvindicação no seu condomínio, discussões sobre doenças raras, fãs querendo chamar a atenção do ídolo ou denúncias de agressões aos direitos humanos. Passa ainda pelo aperfeiçoamento da própria tecnologia, como no caso do Linux. O código-fonte do sistema é aberto a todos que querem melhorá-lo. A própria Wikipedia permite edições em seu conteúdo. E sem a necessidade de se 'logar'. Sem cadastro, fica muito mais fácil a participação. 

Enfim, ele dá vários exemplos de como podemos aproveitar a ferramenta da qual dispomos. O livro termina com um episódio bem bacana: uma garota de quatro anos está assistindo a um programa de TV. Em determinado momento ela corre para trás da tela. Todos pensam que ela queria ver o que estava ali, se era lá o local das personagens. Mas não. Ela procurava o mouse. Para interagir. E quem sabe mudar alguma coisa. “Procurando o mouse” é o capítulo final. Uma deixa para vermos que a mudança pode estar, sim, em nossas mãos.