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terça-feira, 28 de outubro de 2014

o pintassilgo

Está aí um livro de 720 páginas que li praticamente ‘numa sentada’. Logo no início fui cativada pela história, que começa com um homem escondido em Amsterdam. Sem entender o que se passa, retrocedemos alguns anos, direto para um atentado no Metropolitan Museum of Art, em Nova York. O ponto zero.
 
Em “O pintassilgo” (The goldfinch), o protagonista é Theo Decker, de 13 anos. Após ter aprontado na aula, ele tem que ir junto com a mãe falar com o diretor da escola. Antes, porém, uma chuva faz com que eles se abriguem no museu, no meio do caminho. A mãe é apaixonada por arte e fica feliz em mostrar para o menino o seu quadro favorito, o Pintassilgo. Aliás, todo o romance da norte-americana Donna Tartt gira em torno dessa obra, pintada em 1654 pelo artista holandês Carel Frabitius, discípulo de Rembrandt, e hoje exposta no Royal Picture Gallery Mauritshuis, em Haia, na Holanda.
 
Mãe e filho passeiam pelas galerias e, num breve desencontro entre os dois, há a explosão e tudo vem abaixo. O garoto sobrevive e, ao sair dos escombros, leva com ele o quadro holandês. Como superar a morte da mãe e o que fazer com o objeto que furtou são questões que o atormentam. Sem saber a localização do pai, ele é levado para a casa de um amigo. Tempo depois, o pai reaparece e o leva para Las Vegas. No deserto, conhece o russo Boris, que tem mais ou menos sua idade. Os episódios vividos pela dupla me remeteram ao romance “On the road”, de Jack Kerouac, publicado em 1957. O russo lembra o rebelde Dean Moriarty, com seus inúmeros e chatos “Iuuupi! Vamos lá!”. Enquanto Théo é Sal Paradise, que segue a onda do amigo. Tanto lá quanto cá, fiquei entediada com as aventuras. Assim como fiquei nas últimas páginas com tantas divagações repetitivas. Mas nada que comprometa o enredo de Tartt, que felizmente, é muito mais interessante. Inclusive, com direito a um thriller policial lá pelas tantas. Além de pitadas de Dostoievski, Proust, Yeats. 

A autora traz ainda muitas referências da música, das artes plásticas e das antiguidades, já que Theo caminhará também por essas veredas. “Quando estamos tristes – pelo menos eu sou assim – pode ser reconfortante nos apegarmos a objetos familiares, às coisas que não mudam.” Atenção sobretudo aos diálogos dele com Hobie, amigo-pai-padrinho que ganha no decorrer da trama. Vendedor do Prêmio Pulitzer em 2014, vai virar filme em breve. Fica muito a dica.


Trechos:
 
“No inverno, pelo menos, você pode pôr um casaco a mais...”
 
“Não combina com nada que eu tenho, mas não acontece sempre de aquela coisa inapropriada, aquilo que não se encaixa de fato, ser curiosamente a mais querida?”
 
“Todos sempre querem conversar, mas gosto de ficar em silêncio.”
 
“A maioria das pessoas parecia satisfeita com o fino esmalte decorativo e a ardilosa iluminação de palco que, às vezes, fazia a atrocidade intrínseca de a desagradável situação humana parecer de certa forma mais misteriosa ou menos repugnante.”
 
“Mistura deliciosa de gengibre e figos, com chantili e raspas minúsculas e amargas de casca de laranja por cima.”
 
“É difícil concertar as coisas. Você nem sempre tem essa chance.”
 
“O objetivo das coisas – das coisas belas – não é te conectarem a uma beleza maior?”

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