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domingo, 18 de março de 2012

discurso das mídias

A análise das mídias está restrita a observações empíricas que não podem ser comprovadas com exatidão, isto é, estamos limitados à análise com base nos efeitos visados e não nos efeitos efetivos. A esses restam apenas meras hipóteses. Esta é uma das conclusões a que chega Patrick Charaudeau em “Discurso das Mídias”, traduzido no Brasil por Ângela M. S. Corrêa.

O livro é uma verdadeira decupagem de tudo o que envolve a construção de uma notícia, seja ela para a televisão, rádio ou imprensa. Embora sua primeira edição, no original francês, date de fevereiro de 2005, a internet não é mencionada.

Charaudeau inicia seu discurso apontando as três lógicas que regem as mídias: econômica, tecnológica e simbólica. Econômica porque os veículos de comunicação são empresas que precisam vender seus produtos. Tecnológica porque é um fator preponderante para o alcance da informação. Simbólica porque a mídia explora a imagem de ser um meio democrático e que existe para ajudar a população. Não é à toa que esse último fator é o que mais se sobressai nas análises midiáticas.

O autor propõe que alguns conceitos preconcebidos em relação à mídia sejam afastados. Um deles é que elas constituem o quarto poder, ao lado da justiça, do exército e da Igreja. A sentença não se aplica a uma instância que, ao contrário das outras três, não tem regras ou normas conhecidas por todos os envolvidos.

Contradizendo o que os atores da mídia dizem, ela não é a democracia, e sim o espetáculo da democracia. Por outro lado, o cidadão sempre aparece como refém, mas na verdade não o é. Ele compra os produtos fabricados de acordo com suas expectativas e audiência. É um pouco do que diz outro francês, Pierre Bourdieu. O sociólogo, que derrubou a televisão num discurso que virou best seller em 1997, afirma que mesmo diante do lugar-comum, os jornalistas buscam, ou pensam buscar, o extraordinário, o extra-cotidiano. E na eterna perseguição pelo furo de reportagem, acabam por caírem todos na mesma notícia. Como consequência, Bourdieu aponta a uniformização e a banalização dos conteúdos disseminados, tornando os produtos jornalísticos homogêneos. Na verdade, o que temos é uma produção coletiva. Para não frustrar seus públicos, os jornalistas não podem deixar de noticiar o que foi comentado “com sucesso” por seus pares nas outras emissoras.

Charaudeau também desmente que a mídia mostra a realidade social. Na verdade, ela impõe a verdade que constrói. Por ser uma linguagem, a informação traz a imagem através da visão do outro. A mídia nos apresenta apenas fragmentações do espaço público.

Toda linguagem é composta por pensamentos e palavras do outro. Desde que nascemos, estamos à mercê do outro, que passa a se integrar a nós à medida que repetimos, imitamos, reconstruímos, inovamos ou até mesmo nos apropriamos, como se fosse mesmo nosso, de um dito de outra pessoa. E isso não é diferente nos discursos midiáticos.

O quadro de referência para a análise proposta por Charaudeau consiste na troca entre duas instâncias: a produção e a recepção. No meio das duas, existe um texto ou o produto midiático. E é aí que o autor se detém a detalhar, por vezes até em demasia, todos os processos da construção da notícia, que envolve escolhas e construção de sentido. Fica a ideia de que o homem não fala para descrever, contar ou estruturar o mundo. Fala, sobretudo, para se posicionar em relação ao outro. É disto que depende sua existência.

“Toda escolha se caracteriza por aquilo que retém ou despreza; a escolha põe em evidência certos fatos deixando outros à sombra. A cada momento, o informador deve perguntar-se não se é fiel, objetivo ou transparente, mas que efeito lhe parece produzir tal maneira de tratar a informação e, concomitantemente, que efeito produziria tal maneira de tratar a informação, e ainda uma outra, antes de proceder a uma escolha definitiva.” (Charaudeau, 2009:38)


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