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quarta-feira, 8 de abril de 2015

adorável heroína

Eu gosto muito de animais e condeno todo e qualquer maltrato. Sou contra a venda de animais de estimação. Aliás, sou contra a venda de qualquer animal, inclusive os que são usados como alimento ou roupa. Não vejo graça em ter passarinho preso dentro de casa com as asas cortadas, peixe em aquário ou hamster em gaiola. São apenas alguns exemplos de exploração que repudio. Para mim são pessoas mimadas que querem porque querem tal raça ou tal bicho. “Ah, eu quero um cachorrinho, vai me fazer companhia, mas tem que ser pequeno, tem que ser Lulu da Pomerânia, por exemplo”. Como a compra é fácil, logo satisfazem seus desejos. Mas daí enjoam, pois são frívolas, e descartam o ‘produto’, partindo para outros ‘sonhos de consumo’. Desta forma, aumentam a indústria responsável pelas altas taxas de animais abandonados e pelo abuso de cachorras que vivem em criadouros apenas para procriar. Mas o papo aqui é para falar de um livro e de outra relação do homem com os bichos, que também não deixa de se apoiar na ideia de que os animais existem para nos servir.

O cão criado para guiar o homem

O norte-americano Michael Hingson ficou cego ainda recém-nascido e, com a ajuda de sua cão-guia, conseguiu escapar das torres gêmeas durante o ataque de 2001. Ele conta sua história em “Minha adorável heroína”, escrito com a ajuda da jornalista e escritora Suzy Flory.
                                                     
Recebi a indicação deste livro com desconfiança. Não gosto de leituras que apelam para doenças ou deficiências. Por outro lado, literatura que traz animais e relatos sobre atentados me atraem. 

A introdução do autor já nos diz praticamente tudo o que vamos encontrar nas próximas páginas. A cegueira, o encontro com a fundação que treina cachorros, todos os animais que o acompanharam, o dia do atentado e a morte por eutanásia de Roselle, a cachorra heroína do título, dez anos depois. Na contracapa é dito que os dois ajudaram outras pessoas a saírem do prédio, o que não é verdade. Pela leitura que fiz, apenas acompanharam o fluxo.

Juntos, Michael e Roselle, desceram de escada 78 andares de uma das torres atingidas. Detalhadamente, ele conta o que fez antes de ir ao escritório em que trabalhava como gerente de vendas. Naquele dia, tinha uma apresentação agendada e, antes do estrondo, estava preparando os últimos ajustes, tendo cuidado, inclusive, do café que seria servido aos convidados.

A cachorra, como sempre, estava embaixo de sua mesa. Quando sentiram o baque, seu primeiro impulso foi, junto com o colega que estava com ele, desligar todos os computadores. Não sabia o que tinha acontecido, mas como algo indicava que a coisa poderia ser séria, eles se encaminharam rapidamente para a saída de emergência. Roselle acompanhou o dono, como sempre, concentrada em sua atividade.

O onze de setembro é apenas uma passagem do livro, embora seja o fato que deu notoriedade mundial a Michael, tanto que depois correu o mundo contando sua experiência. No mais, ele fala como é ser cego, os preconceitos que sofreu (e ainda sofre), a irritação que sente toda vez que alguém pergunta como ele é capaz disso ou daquilo, a persistência dos pais em mantê-lo como uma criança ‘normal’, quando todos diziam que deveria frequentar escola especial, e como a decisão foi importante para sua formação e independência. Gaba-se de ter sido capaz de andar de bicicleta e até de dirigir. Em determinado momento pede ajuda para a fundação que criou para preservar a memória de Roselle. “Espero que as pessoas celebrem a memória Roselle fazendo doações à fundação e nos ajudando a realizar nosso trabalho”. Bom vendedor, afinal. 

Sorriso de um cão. Fonte: R7
Tem um capítulo escrito na voz de sua esposa, que é paralítica. Fiquei feliz por saber que o casal permaneceu com os cães-guia após eles se aposentarem. Não sei se exatamente com todos, pois não fica claro no texto. De qualquer forma, era minha preocupação logo que comecei a leitura. Já me deparei com descasos, como os que levaram cães ao asilo criado no Japão. Louvo a iniciativa de quem criou o abrigo, mas e os antigos donos? Provavelmente os viam apenas como ferramenta de locomoção. Nenhuma justificativa, que não seja a morte ou a completa incapacidade física ou mental da pessoa, vai me convencer do contrário. Aliás, tenho cá minhas dúvidas se todos os cegos que utilizam cães-guia os tratam com o devido respeito. 

Enfim, a narrativa é bem repetitiva e com desnecessário final motivacional. Tomara que a instituição que criou não pense nos cães somente como guias, mas que veja neles um ser vivo que também merece ter escolhas.

“Estou triste, obviamente, porque sentirei muita falta dela, mais do que dos meus outros cães-guia.”


Só quem tem animais de estimação (termo que remete ao especismo), sabe o amor incondicional que eles têm pelos humanos com quem convivem. Penso, contudo, que algumas dessas pessoas, mesmo tendo eles por perto, não sabem nada disso. Será que é tão difícil ignorar o olhar de um animal? Você vai ver que há muito mais sentimentos lá do que em vários homens e mulheres por aí.

Tenho cachorros. Nunca os comprei. Sempre foram encontrados pelo caminho. De qualquer forma, quando defendi minha dissertação que trazia este tema, a professora na banca questionou “não é cruel manter o animal com as patas no cimento, confinados em espaço pequeno”. “Sim, é cruel. Mas mais cruel seria deixá-los nos rua”, é o meu primeiro pensamento. Claro que ela tem razão. E toda vez que saio de casa e deixo o Billy sozinho, essa provocação me vem à cabeça. Por outro lado, não consigo imaginá-lo na rua. Assim como não vejo como ‘devolver à natureza’, como dizem, animais mantidos toda a vida em cativeiro, como os de zoológico, circos e tantos outros que são retirados ainda pequenos de seus habitats para satisfazer o ser humano. #FICAAREFLEXÃO

2 comentários:

  1. Uma estatística sempre é bem vinda quando se trata de um tema como esse, que impacta a nossa emoção.

    Há organizações de caridade que tentam captar recursos para treinar cães-guia. Fornecer um cão-guia a um cidadão americano custa $40,000. Já o custo de prevenir uma pessoa em um país em desenvolvimento de ficar cega por tracoma fica entre $20 e $100. Na prática, é uma escolha entre fornecer um cão a um cego ou prevenir a cegueira de entre 400 e 2.000 pessoas.

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