Por Renata Okumura
Depois de mais de vinte anos conosco, ela precisou ser transplantada. Verde e com folhas largas, a árvore que meu pai plantou na calçada de casa precisou ir embora.
Minha mãe gosta muito de plantas. Ela tem várias no quintal, seu jardim. Samambaias, boldo, alecrim, plantas diversas e, especialmente, orquídeas. Essas se tornaram sua grande paixão.
O carinho também se estende à árvore que tínhamos. Atenção com a poda, água e até com o cercadinho que a protegia. Mas sua raiz estava afetando o encanamento do vizinho e, posteriormente, os canos da rua. Sim, ela cresceu muito. E, pelo jeito, tinha ótima sustentação.
Foi uma decisão complicada. Tudo foi tentado para mantê-la perto de nós. Era hora, porém, de nos despedirmos da árvore. A Secretaria Municipal de Meio Ambiente foi acionada para que ela fosse transferida para outra localidade. Ficamos tristes. Sabe quando você perde alguém que gosta muito? Foi assim com nossa plantinha. Preocupada, minha mãe acompanhou todo o procedimento para a retirada da árvore.
Pode parecer bobeira, mas acredito que as plantas têm sentimentos. Lembro quando minha mãe foi para o Japão em 2008. Pouco antes da viagem, ela podou a árvore. Pode parecer mentira, mas durante sua ausência nenhum galho ou folhinha cresceu. Estava murcha, parecia doente. Quando minha mãe voltou, lá estava ela, novamente cheia de folhas, grande. Viva.
Na época em que meu pai a plantou, era apenas uma mudinha. Com o passar dos anos, assim como meus irmãos e eu, cresceu. Cobria até os fios elétricos de casa e dos vizinhos. Era referência para as visitas: “ao descer a rua, é a casa com uma árvore na frente.”
Ela não está mais lá. Foi para uma rua próxima, mais arborizada. Segundo a subprefeitura, a árvore permanece na região para manter o equilíbrio da fauna e flora. Fui até o novo endereço na expectativa de vê-la, mas eram tantas as árvores que fiquei confusa. Engraçado que lá no meio de tanto verde, uma me chamou a atenção, talvez fosse ela. Agora o carinho e a recordação de infância ficarão sempre comigo. Simbolicamente, guardei um galho com algumas folhinhas. Lembrança deixada na calçada no dia em que ela teve que partir. Quem sabe não seja uma breve viagem.
A árvore |
“Canção divina as cousas comovia,
E de ternura as árvores choravam... E lembrava o luar a luz do dia
E os ribeiros, extáticos, paravam.”
Trecho do poema “A sobra de Eurídice”, de Teixeira Pascoaes, poeta e escritor português (1877/1952). Amante da natureza, seus versos transitam pela 'experiência existencial da saudade”.
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