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sexta-feira, 2 de maio de 2014

o físico

Está aí um livro que quase deixo para lá nas primeiras páginas. A leitura seguia arrastada. Felizmente, insisti e me deparei com uma história que me conquistou. 

"O físico", de Noah Gordon, vai agradar sobretudo aos amantes da Idade Média. De carona com o garoto órfão Rob J. Cole, somos levados a um passeio pelo século XI e pelos primórdios da medicina, já que personagens fictícios se misturam com reais.

Rob tem dez anos. E, numa sucessão de desgraças, perde os pais e se separa dos irmãos. Acaba sendo 'contratado' como assistente do cirugião-barbeiro Henry Croft, conhecido como Barber. Com seu novo tutor, aprende malabarismos e a curar certas enfermidades. Naquela época, médicos eram raros e cabia a esses profissionais saltimbancos, que sempre se formavam olhando uns aos outros, assistir os mais pobres. Após os shows que realizavam, tratavam de dores diversas, feridas, amputavam e também vendiam placebo. Aliás, o maior faturamento vinha das misturas de urina com aguardente, o tal Específico Universal, que sempre chocou Rob, e que supostamente era infálivel para todos os males do corpo. E assim, com a carroça colorida percorriam todas as cidades inglesas, animando e exercendo a medicina tanto quando podiam. Como diferencial contavam ainda com o dom de Rob, que sabia se o doente iria morrer apenas segurando suas mãos. Sensibilidade que não podia ser tão exposta, haja vista a Inquisição, que não hesitava em queimar todos que apresentavam qualquer indício de feitiçaria. 

Mas o que mais me fascinou é o que veio depois. Rob resolve ser médico de verdade. E as melhores escolas ficavam longe, no oriente. Inacessíveis para um pobre cristão. Mesmo diante das adversistades, ele mostra-se determinado a conquistar o tal diploma e parte para a Pérsia, disfarçado de judeu. Em sua jornada, conhecemos as caravanas que cruzavam continentes e o encontro das culturas cristã, judaíca e islã. Aprendemos sobre os primeiros modelos de hospital. Somos apresentados ao jogo do Xá (monarca persa), versão antiga do xadrez. Roubamos elefantes na Índia (os animais sempre foram vítimas do homem. Não sei se sofriam mais antes ou agora com a indústria alimentícia. Enfim. Pelo menos, Rob os respeitava). Participamos do chatir, corrida de 126 milhas romanas, que marca o fim do ramadan. Pelas minhas contas e pesquisas rápidas, algo em torno de 180 quilômetros. Uma ultramaratona. Gostei muito desse trecho. O treino do atleta, sua ansiedade, vontade de terminar a prova com suas mais de 12 horas. A torcida. Inclusive, neste ponto dei uma pausa e fui eu mesma correr minhas seis milhas romanas ;-)

O romance traz ainda paixões, mortes, batalhas, triações e tudo mais o que pede uma boa epopeia. Vale muito, muito a leitura. Já estou com saudades dos personagens. 

Trechos

“Antes do anoitecer acamparam em uma colina, ao lado de um regato. O homem disse que o nome do cavalo cinzento pintado era Tatus - Abreviação de Incitatus, o nome do cavalo que o imperador Caligula amava tanto a ponto de fazer do animal um sacerdote e um cônsul. Nosso Incitatus é um animal razoavelmente bom para um coitado com os sacos cortados - Barber disse, mostrando como cuidar do cavalo, esfregando no animal punhados de relva macia e cinzenta, depois fazendo-o beber e começar a pastar antes de cuidarem deles mesmos.”

“O chatir é nossa corrida nacional, realizada todos os anos e quase tão antiga quanto a Pérsia - disse Karim - Comemora o fim do ramadan, o mês de jejum religioso. Originalmente - tão distante nas brumas do tempo que perdemos o nome do rei que patrocinou a primeira corrida - era uma competição para escolher o chatir do Xá, ou escudeiro, mas através dos séculos passou a atrair para Ispahan os melhores corredores da Pérsia e de outros lugares e adquiriu a característica de grande espetáculo.”

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