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quinta-feira, 12 de maio de 2016

americanah


Assim que li a sinopse, tive a certeza de que iria gostar de “Americanah”, da escritora nigeriana Chimamanda Ngozi Adichie. E não me enganei. Dela eu já havia lido o ensaio “Sejamos todos feministas”, baseado em uma palestra que deu. Gostei, sobretudo, pela identificação com alguns momentos da história. Literatura é isso. É poder resolver alguns de nossos dilemas por meio da experiência de outras pessoas, mesmo que sejam fictícias. 

A narrativa é em terceira pessoa, de forma onipresente e onisciente. Começamos com Ifemelu indo trançar os cabelos. Ela já está há 13 anos nos Estados Unidos e se prepara para retornar para ‘casa’. A partir daí inicia-se uma série de lembranças da sua infância e adolescência em Lagos, maior cidade da Nigéria. Foi lá que conheceu Obinze. Apaixonados, eles vivem um conto de fadas, que é interrompido com a ida de Ifemelu para a “América”. As dificuldades financeiras a levam a tomar uma atitude que culmina com a decisão de cortar relações com o namorado. Sem entender os motivos, ele toca sua vida e vai para a Inglaterra. Seu sonho sempre foi ir para os Estados Unidos, mas nunca conseguiu o visto. Isso vamos descobrindo ao longo da história, que sempre intercala momentos presentes com o passado. Ora tendo Ifemelu como foco, ora (menos vezes), Obinze. 

Destaque para o sucesso do blog que ela cria para tratar de questões raciais. Foi nos Estados Unidos que se descobriu negra, e as consequência que isso traz. Acompanhamos ainda seus relacionamentos com um branco e com um negro norte-americano. Cada qual com sua importância. E entre um pensamento e outro, sempre a presença de Obinze. Já ele, não tem a mesma sorte no estrangeiro e acaba sendo deportado. Inesperadamente, a sorte (ou não) surge e ele torna-se um rico empresário, casado e com uma filha. 

Há ironia ao tratar dos nigerianos abastados. A necessidade de sempre querer ter mais, pagar mais por qualquer coisa. Confortos desnecessários e a fixa ideia de que tudo e todos podem ser comprados (será que é só na Nigéria?). 

Nos Estados Unidos, a discussão é sobre o branco e sua relação com os que não têm a mesma cor. Uns finge, outros são diretos, outros tentam compensar o racismo sendo extremamente bajuladores. Como a patroa rica que tenta de todas as formas mostrar que não vê diferença entre brancos e negros. A todo momento procura elogiar negros, até que ouve de Ifemelu que nem toda negra é bonita. É aquele sensação de não querer dar margens para que pessoas a achem racista ou pior: por pena, sempre tenta agradar. 

Do outro lado, há o branco pobre que vai tratar Ifemelu com desconfiança quando supõe que ela seja a dona da casa rica que o chamou para limpar os carpetes. Mas ao descobrir que ela é apenas a baba, age com camaradagem. Recortes das cenas reais que atestam que a cor da pele ainda é motivo para julgamentos e ataques. 

A única parte que me entediou foi quando ela vai ao encontro de pessoas que voltaram do exterior. Muito chato. Cansativo. Bla bla bla. Não sei se essa foi a intenção da autora. Lá temos todos os estereótipos desses filhos regressos: esnobes, saudosos das facilidades da Europa ou Estados Unidos, implicantes com a morosidade da Nigéria. Há até uma que lamenta a falta de restaurantes vegetarianos. Só não gostei da jeito com que a moça é descrita: magra e de olhos fundos. Não somos assim, Chimamanda ;-) “Ela vai voltar uma tremenda Americanah”, diz determinada personagem no início do livro ao referir-se à menina que vai aos Estados Unidos. Referência às inevitáveis mudanças que tal viagem fará. Leitura rápida e fácil. Não chega a levantar polêmicas nem propor soluções. Mas mostra situações que talvez você nunca tenha imaginado. Vale muito a leitura.

"Ifemelu se lamentava por isso, pela perda do que poderia ter sido."

"Aquele era o presente que se dava toda semana; ir à livraria, comprar um café caro demais, ler o máximo que pudesse de graça e se tornar Obinze de novo."

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