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sexta-feira, 27 de abril de 2012

a contadora de filmes

“Naquele tempo descobri que todo mundo gosta que alguém conte histórias. Todos querem sair da realidade um momento e viver esses mundos de ficção dos filmes, das radionovelas, dos romances.”

Deserto do Atacama, Chile

Com “A contadora de filmes”, o chileno Hernán Rivera Letelier nos aproxima do deserto de Atacama, conhecido como o mais solitário do mundo.

O livro fala sobre uma família apaixonada por cinema. Até que um acidente de trabalho tirou o movimento das pernas do pai, parte da renda e a rotina dos domingos daquela casa. Tirou ainda a mãe, que não suportou a invalidez do marido e foi embora, deixando com ele cinco filhos pequenos.

Como sempre acontece, a vida seguiu. Restou apenas a fuga da aridez por meio dos filmes. Ficção e realidade se misturavam com as aparições de Jerry Lewis, Marilyn Monroe, John Wayne e todo o elenco dos filmes mexicanos, os preferidos. Como não havia dinheiro suficiente para irem ao cinema juntos, como antigamente, a proposta foi que apenas um dos filhos assistisse aos filmes com a obrigação de contar o enredo quando voltasse.

A escolhida foi a caçula, Maria Margarida, que se mostrou melhor que os irmãos. Mais que narrar, ela interpretava, apropriava-se das obras, cantava e fazia seus próprios desfechos. Sempre que a memória falhava, sempre que sentia que a cena poderia machucar o pai. E assim passou a ser conhecida pelos moradores do povoado, que também queriam assistir a sua interpretação. Ganhou a notoriedade de suas estrelas favoritas. Tanto que, a exemplo de seus ídolos, mudou de nome no auge do sucesso: Fada Docine, contadora de filmes. Mas vieram as desilusões, a televisão e o golpe de estado de Pinochet. Ficaram, contudo, as histórias e a nostalgia daqueles que tiveram seus sonhos truncados. O livro será adaptado para o cinema por Walter Salles.

"Acho que no fundo eu tinha alma de fuxiqueira, pois além de tudo me bastava bater os olhos nas duas ou três fotos pregadas no cartaz – pelo olhar lascivo do padre, o sorrisinho inocente da menina ou o gesto cúmplice da beata – para poder inventar uma trama, imaginar uma história inteira e passar o meu próprio filme."


segunda-feira, 23 de abril de 2012

promoção - dia mundial do livro

Hoje é o Dia Mundial do Livro. Para celebrar a data, vamos sortear um dos cinco exemplares abaixo.

Para participar, basta clicar aqui e dizer o título que quer ganhar. O sorteio será na próxima segunda-feira, 30 de abril, e o vencedor levará o livro que assinalou.
Boa sorte e boas leituras.









Resultado do sorteio, 30/04/2012

O sorteio da promoção Dia Mundial do Livro acabou de ser realizado. E o vencedor foi Fabiano Menezes, que escolheu o livro Questões do Coração.

Muito obrigada a todos.





sábado, 21 de abril de 2012

de como enganei o sol

Sabe quando você programa uma atividade ao ar livre e conta com o sol. Lá, brilhando e aquecendo seu lazer? Pois é assim com o protagonista do livro infantil "De como enganei o sol", de Ricardo Azevedo.

O garoto veste o uniforme e sai para jogar futebol no campo. Mas tão logo põe os pés na calçada vê o tempo se fechando, “ameaçando um toró”. Desanimado, volta para casa, veste outra roupa, mais adequada à chuva, e muda seus planos. Com seu jogo de botões nos braços, decide ir à casa de um amigo. Mais uma vez, o sol parece estar de brincadeira com ele. Ao sair, o sol está brilhando. Volta a colocar seu calção, camiseta e tênis. Sai. E lá vem chuva.

Furioso, tem uma ideia: o sol que o aguarde. Ritmo, poesia e ótimas ilustrações dão o tom nesta fábula. Pena que está esgotado. Junto com "O goleiro e a bola" e "O cavalinho Pinga Fogo", integra o trio que ganhei na quarta-série, prêmio por ter dado algumas aulas de reforço para alunos mais novos. Por isso, estão aqui. Por isso, são inesquecíveis ;-)

“Acordei de manhãzinha
e dei um pulo da cama,
vesti o calção vermelho,
a camiseta listrada
que eu ganhei da minha avó,
calcei o tênis de briga,
tomei café e voei
pro campo de futebol.”



o cavalinho pinga fogo

É na Vila Tristeza, que de tristeza não tinha nada já que todos eram felizes, que nasceu e cresceu Pinga Fogo. O nome foi dado por um dos meninos do local, o Alemão, que conheceu o cavalo ainda pequeno. O ponto de encontro deles e de todas as outras crianças era o lago. Lá eles pulavam na água, comiam as frutas frescas que havia nos arredores e se divertiam muito, sempre acompanhados de Pinga Fogo, que repetia os gestos da molecada.

Até que chegou o dia da procissão em homenagem à padroeira da vila. O dia festivo ficou ainda mais especial com a visita do prefeito da cidade mais próxima, que aproveitou para assistir aos desfiles. Inclusive o de Alemão com Pinga Fogo, que atraiu a atenção do seu filho. “Pai, me compra aquele cavalinho.”

A expectativa de todos era que o prefeito contribuísse para que o lugar se tornasse uma cidade e que passasse a ter luz elétrica. A promessa foi feita e em troca ele “apenas” pediu o cavalinho para o filho. E assim foi feito, um dia depois lá se foi Pinga Fogo para as mãos do menino rico. Alemão ficou inconformado, chorou e sofreu muito. O tempo passou e nada de energia elétrica. Até que os meninos vão para a cidade conhecer o cinema. Adivinhe quem eles encontram? Pinga Fogo exposto na feira de cavalos. São informados que o filho do agora ex-prefeito utilizava o bicho como brinquedo. Inclusive charrete o animal teve que puxar, sendo a todo instante chicoteado. Depois de machucá-lo, o menino enjoou e o jogou fora. Todos vão torcer para que Alemão consiga ter seu grande amigo de volta. Ótima lição para as crianças e para os pais. "O cavalinho Pinga Fogo", de Fernando Lobo, nos mostra que os animais não são objetos que podem ser descartados. O amor não é comprado e, sim, conquistado.

“Quero que ele viva livre e correndo feliz no campo. Livre, correndo, brincando e se atirando na lagoa como antigamente. Por favor, se o senhor quer dar um prêmio ao meu cavalinho, esse é o melhor de todos: a liberdade.”


o goleiro e a bola

O futebol era uma das paixões de Jorge Amado. E esse amor rendeu um belo livro infantil, “A bola e o goleiro”, escrito em 1984. O romance fala sobre Fura-Redes, a bola que era a alegria dos artilheiros. Com ela, os jogadores faziam gols sensacionais e inesquecíveis. Os locutores também ficavam enlouquecidos ao narrarem seu percurso. A habilidade para balançar a rede deu-lhe vários apelidos, tais como Esfera Mágica, Goleadora Genial, Pelota Invencível e Redonda Infernal.

Totalmente imparcial, Fura-Redes não privilegiava nenhum time. Queria apenas proporcionar gols e mais gols. Jamais permitia um zero a zero nas partidas que participava. Até que conheceu o goleiro Bilô-Bilô, também conhecido como Cerca-Frangos, Mão Podre, engolidor de francos. Nem precisa dizer que era o desastre do desastre entre os goleiros. Contudo, o inesperado aconteceu. Ao ver Bilô-Bilô com sua camisa cor de caramelo, Fura-Redes se apaixonou. Perdidamente. Tudo o que queria era alinhar-se nos braços do seu amado. A partir daí, por mais que continuasse atuando da mesma forma, Bilô-Bilô não viu mais nenhuma bola entrar no “arco” que guardava. Defendia todas as jogadas. Todos os lances iam direto para suas mãos. Passou a ser chamado de Pega-Tudo e virou celebridade internacional.

Mas chega o dia em que o Rei do Futebol vai tentar seu milésimo gol. E quem entrará em campo junto com o time do melhor jogador do mundo? Bilô-Bilô e Fura-Redes, com certeza. O que será que vai acontecer? O livro foi publicado também em Portugal e ganhou versões em inglês, francês e alemão. A primeira edição, que é a que eu tenho (capa abaixo), traz ilustrações de Aldemir Martins. Boa história, com final que representa a inocência infantil.


segunda-feira, 16 de abril de 2012

tempo para refletir

Por Renata Okumura, repórter da Rádio Estadão ESPN


Uma garotinha francesa, com cinco anos no máximo, arrancou risos e suspiros de tão graciosa que estava no vídeo exibido durante a palestra da jornalista e psicóloga Mônica Ferrari, parte de um curso para formar contadores de histórias.

A imaginação representa nossas vivências, não tem limites e encanta. A pequena surpreendeu a todos e até a própria mãe, que a filmava, ao contar a história de animais como macacos, leões e hipopótamos. Gesticulava e fazia biquinhos para expressar ação ora alegre, ora triste, ora macabra. Até a bruxa má ela soube imitar. Futura contadora de histórias? Quem sabe. Mas que o vídeo serviu de inspiração para todos na palestra, não há dúvida.

Em exatas três horas, a palestrante clareou a mente do grupo sobre a importância de saber administrar o tempo com todas as tarefas pessoais e profissionais e, ainda, encaixar o trabalho voluntário no cotidiano.

“Tempo é bússola e cabe a cada um encontrar o seu norte”. No dia a dia, tantas são as tarefas com a família, com o trabalho e mesmo com as atividades pessoais. Contudo, urgências e imprevistos podem ocorrer e, querendo ou não, é preciso estar preparado. No momento de decidir ser um voluntário, mais especificamente um contador de histórias, é necessário levar em conta a disponibilidade e a dedicação com esta missão. Saber que “não importa se faça sol ou faça chuva, as crianças estarão lá aguardando ansiosamente pelo momento de cultura e de entretenimento. No hospital o tempo é diferente.”

E como fazer com que todas as nossas tarefas sejam realizadas de forma planejada e prazerosa? O dia tem apenas 24 horas e às vezes parece ter até menos. Por isso, a importância de definir prioridades para alcançar um melhor rendimento, listar e ordenar as ações diárias. Na ‘Matriz de Prioridades’, de Stephen Covey, apresentada na palestra, essas ações são tidas como importantes: noite de sono, momentos com a família e amigos, refeição, higiene pessoal, locomoção, educação, academia, cuidar da casa, lazer e entretenimento. E neste leque deve fazer parte também o voluntariado.

O grupo foi questionado pela palestrante: “de quais feitos se orgulharia de contar para seus filhos, familiares e amigos aos 85 anos?” Pergunta intrigante, mas que já demonstra o anseio em buscar algo inovador, fazer nosso tempo valer a pena. Saber que podemos fazer a diferença na vida de alguém, por exemplo, com gestos e até mesmo com palavras.

Mônica apresentou dois livros que podem ajudar na organização pessoal: ‘Ritmo da Vida’ e ‘Administrador de Sonhos’, ambos de Mathew Kelly. Publicações que retratam a forma de lidar com o tempo. Também mostrou o conceito ‘A Tríade do Tempo’, de Christian Barbosa, que diz: “70% do nosso tempo deve ser dedicado as ações que planejamos, 20% para questões urgentes e somente 10% para circunstâncias, ou seja, momentos à toa.”

Aprender a delegar tarefas e a dizer não, no momento certo e sem magoar o outro. Divergir sem conflitar. Tentar não se sobrecarregar. Foram atitudes demonstradas em um trecho do filme ‘A Negociação’.

Agora reflita: o trabalho voluntário cabe na sua vida? É possível encaixá-lo no seu cotidiano sem deixar de lado o que já faz hoje? Com planejamento tudo é possível. E imaginar uma criança feliz após compartilhar uma leitura infantil já é algo animador, assim como fazer parte desse processo de aprendizado e de criatividade. Quem sabe ajudar a prepará-la para ser como a menininha francesa. Imaginar o aceno de até logo. E um sorriso de empolgação e agradecimento quando chegar o próximo encontro. Isso vale cada segundo do nosso tempo.

Contadora de histórias inata
 

sábado, 14 de abril de 2012

o gatinho perdido


Neste livro de Therezinha Casasanta temos uma doce menina, a Lelinha, que encontra um gatinho perdido. Leva-o para casa e é repreendida pela mãe, pois não é certo ficarmos com algo que não é nosso. Então, a garota sai pelo bairro de porta em porta a procura do possível lar do bichano. Fala com o padeiro, com o relojoeiro e com vários outros comerciantes. Contudo, no fundo, no fundo, seu coração torce para que todos digam que não conhecem o dono do gatinho preto com mancha branca na orelha.

“Lelinha olhou para cima e viu o gatinho, encolhido, no alto do chafariz, no meio da praça.
— Coitadinho! – disse Lelinha, pegando o bichinho.
— Vamos para casa.”

Como estou a revisitar meus livros infantis e a vascular por novas histórias desse tipo, outras dicas serão, em breve, postadas.

quatro amigos


O livro de Tatiana Belinky conta a história de quatro amigos (homem, cachorro, gato e gavião) que fizeram o pacto de lealdade. A partir do lema dos três mosqueteiros “um por todos e todos por um”, prometem que vão estar sempre juntos. Na alegria e na tristeza. Mas no primeiro instante de perigo, somente um deles lembra-se da promessa. Qual será?

“Você arriscou a própria vida para me defender e me salvar! Obrigado, amigão!”

sexta-feira, 13 de abril de 2012

um blog para refrescar a memória

Escrever sobre livros é uma boa forma de mantê-los por mais tempo na mente. Além de poder partilhar o que foi lido.

Lamento não ter iniciado o blog bem antes. E assim ter registrado mais resenhas, resumos e comentários. Admiro as pessoas que citam com propriedade livros que leram há anos. Eu não consigo me lembrar com detalhes nem dos mais recentes. Por outro lado, esse é outro motivo para eu revisitar minha estante. Abrir aleatoriamente os livros e refrescar a memória. Tarefa, aliás, empolgante.

O que devemos considerar, porém, é o que sentimos no exato momento da leitura. O sorriso nos lábios enquanto os olhos percorrem as páginas. A excitação com o desenvolvimento da trama. A diversão com a ironia de alguns autores. O olhar perdido quando chegamos ao fim - sinal de que valeu a pena cada linha lida. Sem contar o silêncio que nos proporciona. Algo tão raro e, por vezes, distante.

Livros que me deixaram assim, sem palavras e a divagar.




  


terça-feira, 10 de abril de 2012

as intermitências da morte

Há quem diga que precisamos sempre pensar na morte. Já que vamos morrer, temos que aproveitar bem os "últimos dias". Logo me lembro da música de Assis Valente “E o mundo não se acabou”, que diz: “Anunciaram e garantiram que o mundo ia se acabar... Acreditei nessa conversa mole... E sem demora fui tratando de aproveitar. Beijei na boca de quem não devia. Peguei na mão de quem não conhecia.” E para desespero de todos, “o tal do mundo não se acabou.”

Em “As Intermitências da Morte”, do escritor português José Saramago, não foi o mundo que “não se acabou”, mas a morte que não chegou. Motivo: cansou de ser odiada pelos humanos e resolveu mostrar o quanto é importante. Logo no primeiro parágrafo do livro, Saramago nos explica a situação:

“No dia seguinte ninguém morreu.”

“Passar-se um dia completo, com todas as suas pródigas vinte e quatro horas, contadas entre diurnas e nocturnas, matutinas e vespertinas, sem que tivesse sucedido um falecimento por doença, uma queda mortal, um suicídio levado a bom fim, nada de nada, pela palavra nada. Nem sequer um daqueles acidentes de automóvel tão frequentes em ocasiões festivas, quando a alegre irresponsabilidade e o excesso de álcool se desafiam mutuamente nas estradas para decidir sobre quem vai conseguir chegar à morte em primeiro lugar.”

Todos celebram num ímpeto. Afinal, sobrevivem a acidentes, doenças crônicas e demais males que teriam levado o cidadão desta para melhor. Contudo, o que parecia ser uma dádiva, passa a incomodar. Os enfermos se multiplicam, lotam hospitais, estorvam os familiares e, claro, sofrem. Como não há morte, a dor torna-se eterna.

Governo e igreja confabulam. Enquanto uns pensam no que será feito da previdência social, outros discutem que não há mais vida após a morte. Assim sendo, qual seria a razão da religião? Filósofos e economistas também lançam seus pensamentos diante da grave situação. Enquanto isso, as funerárias padecem com o desaparecimento de seu público-alvo.

Passado algum tempo, descobre-se que a greve atinge apenas aquele país. Do outro lado da fronteira, é possível morrer. É só atravessá-la para que a pessoa possa, enfim, descansar em paz. Como tudo o que é fácil pode ser complicado, a burocracia dificulta a vida (ou morte) dos moribundos. Eis que surgem as brechas, os oportunistas e a máfia, que passa a dominar o esquema da travessia. Neste trecho temos grande ironia de Saramago em relação à política e à sociedade. Aliás, como em todas as suas obras, há trechos hilariantes. Você “morre de tanto rir”.

Do outro lado, a morte assiste a tudo de camarote. Até que muda de estratégia e pede para que uma carta sua seja lida em rede nacional de televisão. O país para e ouve o que ela tem a dizer. O que ela não previu é que se apaixonaria por um humano. E ninguém morre enquanto a morte sofre por amor. Li o livro há mais de seis anos, mas ele ainda está muito presente na minha mente. Imperdível.




E o mundo não se acabou, na voz de Adriana Calcanhotto

segunda-feira, 9 de abril de 2012

as consolações da filosofia

Alain de Botton sabe muito bem como escrever livros que tratam de temas universais e que trazem à tona nossas preocupações e angústias, como relacionamento, religião e carreira profissional. Já falei sobre dois de seus livros: “Movimento Romântico” e “Ensaio de Amor”, indicados para aqueles que sofrem por amor.

Suíço radicado na Inglaterra, Botton é pesquisador e professor de filosofia na Universidade de Londres. Seus livros misturam romance e ensaio. Ele geralmente conta uma história, que é interrompida para a abordagem filosófica do dilema apresentado. Outro ponto constante em suas obras, e que as tornam agradáveis, é a ironia. E é exatamente isso que faz com que “As Consolações da Filosofia” tenha um gostinho de quero mais. Ela nada mais é do que um guia prático para resolver problemas por meio de alguns pensadores. Leitura fácil, rápida e descontraída. Nada profunda, porém. Pode até ser que alguém afirme que a filosofia seja banalizada em seus livros. Mas pode ser, também, que eles sejam o convite que faltava para aqueles que já ouviram algo sobre Sócrates, Sêneca ou Nietzsche e nunca tiveram a coragem de encará-los.

Tópicos de “Consolações da Filosofia” e a forma com que o autor aborda os filósofos:

Consolação para a impopularidade e Sócrates, que foi condenado à morte pelo povo de Atenas por, além de não venerar os deuses da cidade, ainda introduzir novas formas de pensamento religioso.

“Mas o filósofo não havia se curvado perante a impopularidade e a condenação do Estado. Não se retratou ou abriu mão de suas ideias por ter sido alvo de reclamações. Além do mais, sua confiança havia se originado de uma fonte mais profunda do que a impetuosidade ou bravura leonina. Ela havia sido fundada na filosofia.”

Consolação para quando não se tem dinheiro e Epicuro, apreciador dos prazeres da carne.

“Na realidade, ele nada mais fez do que, depois de uma análise racional, chegar a conclusões surpreendentes sobre o que de fato tornava a vida agradável – e, felizmente para os que não dispunham de uma boa renda, parecia que os ingredientes essenciais do prazer, por mais impalpáveis que fossem, não eram muito dispendiosos.”

Consolação para a frustração e Sêneca, que foi preceptor de Nero por cinco anos, e por ele condenado à morte. Ao ver seus amigos e esposa inconsoláveis, disse:

“Onde está sua filosofia e o que foi feito da decisão de jamais se deixarem abater diante da iminência de qualquer desgraça que, durante tantos anos, todos vêm incentivando uns aos outros a manter? Certamente ninguém ignorava que Nero era cruel. Depois de matar a mãe e o irmão, só lhe restava matar seu conselheiro e preceptor.”

Consolação para a inadequação e Montaigne, que nos compara aos animais, segundo ele, dotados de instinto muito mais apurado (e inteligente) que o nosso.

“Com suas tabuletas pintadas, Montaigne já havia delineado um tipo de filosofia que reconhecia o quanto todos nós estávamos muito longe de sermos as criaturas racionais e serenas que a grande maioria dos pensadores da Antiguidade acreditara que fôssemos. Éramos quase sempre histéricos e dementados, inquietos e vulgares; comparados conosco os animais eram, em muitos aspectos, modelos de sanidade e virtude – uma triste realidade sobre a qual a filosofia via-se obrigada a refletir, apesar de raramente o fazer.”

Consolação para um coração partido e Schopenhauer, um dos maiores pessimistas da história. Seu dilema: “o único erro inato é pensar que viemos ao mundo para sermos felizes. Enquanto insistimos neste engano, o mundo nos parece cheio de contradições.”

“Por que ele? Por que ela? Constitui um dos mistérios mais profundos do amor.”

Schopenhauer não vida nada de enigmático nesta questão. Não dispomos da liberdade de nos apaixonar por todos porque não podemos gerar filhos saudáveis com todos. Nossa vontade de viver nos leva a procurar as pessoas que irão aumentar nossas chances de gerar uma prole inteligente e bonita e nos afasta daqueles que possam diminuir estas mesmas chances. O amor nada mais é do que a manifestação consciente da descoberta do pai ou da mãe ideal apontada pela vontade de viver.”
 
Consolação para as dificuldades e Nietzsche, um dos poucos filósofos a tratar do infortúnio e do pessimismo.

“Toda a vida é difícil; o que torna algumas vidas satisfatórias é a maneira de encarar o sofrimento. Todo o infortúnio é um indício vago de algo vai mal. Reverter ou não este prognóstico depende do grau de sagacidade e de determinação daquele que sofre.”

“Eliminar toda e qualquer raiz negativa significaria simultaneamente sufocar os elementos positivos que podem brotar desta mesma raiz e florescer em galho mais alto da planta.”


domingo, 1 de abril de 2012

reconhecimento dentro das organizações

12º Mix Aberje de Comunicação Interna e Integrada

No último dia 23, participei do 12º Mix Aberje de Comunicação Interna e Integrada. O evento abordou mídias digitais, liderança, confiança, segurança no trabalho, engajamento, reconhecimento e diversidade. Comunicar é tornar comum. É partilhar. Por isso, divido com vocês um pouco do que apreendi e aprendi.

Começo pela última palestra. Ela foi feita pelo professor, consultor e filósofo Mário Sérgio Cortella, que trouxe à tona o “reconhecimento dentro das organizações”. 

A explanação foi marcada por frases e máximas. Uma delas veio direto da regra 34 de São Bento, que diz que é proibido resmungar. Cortella enfatiza que quem resmunga nunca faz. O resmungão, muito presente nas redes sociais, é um preguiçoso. Não passa de um pessimista cuja única atividade é sentar e esperar que tudo dê errado. “Precisamos pensar sobre isso quando falamos de valorização de pessoas, pois vivemos num ambiente no qual a comunicação é cínica.”

Aproveitando, lembra a origem da palavra cinismo, que vem do grego cachorro. Cinófilo é quem gosta de cachorro. E “Cinismo” é a doutrina criada pelos filósofos socráticos Antístenes de Atenas e Diógenes de Sínope. Para Diógenes, o homem só precisa de si mesmo, por isso, largou tudo e foi viver dentro de um barril, nu. Ele vivia como um cachorro (daí o cinismo), opondo-se às regras, ao materialismo e às convenções sociais. A principal frase dele é: “foi sem querer querendo”. Lembra algo? Isso mesmo, esta foi a inspiração para o seriado Chaves. Lá, ninguém tem animais de estimação, pois o próprio Chaves é o mascote dos moradores da vila.

A noção de tempo dos ocidentais, imediatistas por natureza, foi outro ponto abordado. O professor nos compara aos orientais e dá alguns exemplos. Para os chineses, é difícil entender o porquê de comemorarmos os dez anos da queda das torres gêmeas. Na China nada é celebrando antes de completar 500 anos. O mesmo vale para os hinduístas, que têm o pensamento reencarnacionista. Brinca ao falar sobre o plano de carreira deles: “deve ser mais ou menos assim: se não der certo nesta vida, dará na outra.”

Já aqui, temos a noção de apenas uma vida. Estamos aqui para aproveitá-la. Essa atitude impede a reflexão, aumenta a ansiedade e gera frustração. Também perdemos oportunidades importantes, que são deixadas de lado porque não damos tempo ao tempo. Cita uma frase do escritor francês François Rabelais que resume seu pensamento: “conheço muitos que não puderam quando deviam, porque não quiseram quando podiam.”

Como consequência nos acostumamos e aceitamos bem as pequenas mortes do dia a dia: as rupturas no ambiente familiar, nos negócios, nas amizades e até no lazer. A ganância acaba se confundindo com a ambição. Enquanto a segunda é saudável, uma vez que parte apenas do “quero mais”, a primeira pressupõe o egoísmo, ou seja, “quero só para mim”.

Todas essas colocações são feitas para embasar o tema de sua explanação: reconhecimento. Para ele, reconhecer alguém é mostrar a falta que a pessoa faz, seja por meio de ritos, lembranças ou mesmo da comunicação. Nas organizações, é o reconhecimento que vai determinar o desempenho do profissional e a felicidade no ambiente de trabalho. Aliás, ressalta que trabalho é algo que gostamos, é vida. O que é muito diferente de emprego, apenas uma fonte de renda. “Encontre no emprego o trabalho que quer ter”, aconselha. O trabalho cansa, mas não estressa. Cansaço pede um esforço intenso e é curado com o sono. Estresse é um esforço para fazer algo que você não sabe direito o que é, ou seja, vem de uma ausência de sentidos. E só é curado por meio da mudança.

Reconhecer é, portanto, o oposto de morte. Morrer é ser esquecido, tanto que no grego antigo, morrer e esquecer têm o mesmo significado. O que vemos hoje nas empresas são muitas mortes. Pessoas, metas, produtos. Tudo é facilmente substituído. O reconhecimento tem alto valor competitivo, ele dá vitalidade e proporciona realização de maneira sincera. Sentimos-nos importantes.

Pergunte-se: “se você não existisse, que falta faria?” E o que você faz para mudar isso? Para ser reconhecido, é preciso, antes, reconhecer.

Algumas frases para pensar:

• Sinceridade é necessária. Franqueza, não. Como vivemos em sociedade, temos que ser sempre sinceros, no entanto, não precisamos dizer exatamente tudo o que pensamos.

• Você só conhece alguém de verdade quando essa pessoa errou e, mesmo assim, não desistiu.

• A expressão “não sei” estimula a inteligência. Não enrole seu interlocutor. Se não sabe, aprendam juntos. Já dizia Millôr Fernandes, “se você não tem dúvidas, é porque está mal informado.”

• O chefe você obedece. O líder você segue.