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sexta-feira, 11 de fevereiro de 2011

um festim para o amor

Um elogio ao amor. Esta foi a proposta para "O Banquete" relatado por Platão três séculos antes de Cristo. Um diálogo entre Aristodemo, Ágaton, Sócrates e outros filósofos gregos. Neste debate, é consenso de que "Amor é entre os deuses o mais antigo. E sendo o mais antigo é para nós a causa dos maiores bens." Se até para os grandes pensadores não existe "maior bem para quem entra na mocidade do que um bom amante, e para um amante, do que o seu bem-amado", o que dizer dos sonhadores aqui na Terra? Que no meio de expectativas, frustrações e conquistas efêmeras aguardam o par perfeito.

Dentro deste público, que crê no Amor (assim mesmo, com A maiúsculo) e ainda espera por um príncipe encantado, está Roberta Maria Fabbri.

Fé. Esta é a palavra que define a paulistana de 28 anos. Pele clara, olhos verdes, cabelos louros ondulados até o ombro e nariz preponderante caracterizam a nossa personagem. Roberta também é, quase sempre, uma mulher de poucas palavras.  Expressão calma assinalada com um sorriso velado e desconfiado. A voz suave ganha força com pausas precisas, no compasso dos olhos. Cerra as pálpebras e movimenta o globo ocular antes de pronunciar algo importante. Uma característica explícita: não age sem pensar.

A vaidade é disfarçada pela simplicidade. Constantemente adota o jeans e uma blusa em tom pastel para compor seu visual. São raras as ousadias. Exceção para os sete furos na orelha, e mais recentemente ao piercing no dente canino, do qual orgulha-se: "É azul claro, minha cor preferida." É a típica menina de família. Não são raros os momentos em que entra no carro com os pais e o irmão, onze anos mais novo, para almoços, passeios e visitas aos parentes mais próximos. Católica praticante, ela pode ser facilmente encontrada aos domingos, a partir das dezoito horas, na Paróquia São João Batista, no bairro Itaim Paulista, em São Paulo. Amiga das beatas, dos padres e seminaristas, seus aniversários são sempre acompanhados de uma oração ligada pelo terço.

No entanto, a aparência tranqüila esconde uma mulher decidida, que não gosta de perder tempo. Não hesita em tomar todas as iniciativas quando está diante do que quer. Ou melhor, do que desperta o coração. Neste momento, ela se revela uma outra pessoa.

Capaz de arriscar. Explodir. É quando escolhe a arma mais poderosa e parte para a guerra. Sem escudo ou armadura. Pois o importante é ser vista e, quem sabe, atingida.

Mas o que é o amor para a jovem que tem na religião e na família a base de seus valores? "É tudo. Se não tiver amor na vida você não é nada", afirma ela. "É também sacrifício. Um fazendo a vontade do outro."

Roberta acredita convictamente que há uma pessoa em algum lugar do planeta que é a sua outra metade. "A gente só não se cruzou ainda." Espera pelo príncipe encantado. "Ele vai aparecer do nada. Quando eu menos esperar", declara. E se o destino tardar, "a gente dá um empurrãozinho. Apronta algumas." Por amor, ela já estrelou várias cenas dignas de novela.

Uma das mais inusitadas começou no restaurante da tia, no Shopping Internacional de Guarulhos, em São Paulo. No caixa, ela viu um rapaz que atraiu sua atenção. Passou a ir ao local com mais freqüência. Contudo, faltava oportunidade para um primeiro contato. Sem saber nem mesmo o nome dele, recorreu a uma amiga "mais extrovertida". O telefone do estabelecimento era o único arsenal. Mas foi suficiente para o plano. A amiga ligou para o garoto e disse ser uma admiradora secreta. Descobriu nome, estado civil e aguçou a curiosidade do alvo. Depois de um mês de telefonemas foi marcado um encontro. Às escuras. Para ele, é claro, que esperava encontrar uma pessoa para depois descobrir que ela era outra. Confuso? Não mais que os pensamentos de Roberta. "Eu ficava imaginando o que falaria. Ele nunca poderia imaginar que seria eu. A sobrinha da patroa dele". Durante todo o dia, "aquele negócio ficava matutando na cabeça", confessa. Mesmo assim, ela se mantinha otimista em relação à reação do rapaz. Chegou meia hora antes no lugar combinado. A entrada principal de um Shopping Center na zona leste da capital paulista.

"Dei uma volta pelas lojas até ele chegar. Porque ele tinha que chegar primeiro. Eu tinha de ir ao encontro dele." Quando o avistou, todos os sintomas do nervosismo apareceram. Frio na barriga. Suor. Pernas tremendo. E agora? Bem, não tinha mais jeito. Era pegar ou largar. Caminhou até o rapaz e o abordou:

- Nossa! Você por aqui. Que coincidência.

- Pois é, você também por aqui.

- O que você esta fazendo por estes lados?

- Eu estou esperando uma amiga.

- Interessante. Eu também estou esperando um amigo.

Silêncio constrangedor. Roberta percebeu que ele não parava de olhar no relógio. Ela precisava criar coragem para dizer a verdade.

- Aconteceu uma coisa muito estranha comigo - ele confessa, constrangido e hesitante. Ligou uma menina falando que queria me conhecer de qualquer jeito. E marcou um encontro aqui. Eu vim só para ver quem é essa menina. Agora, estou aqui pensando. Foi loucura minha ter vindo.

- Nossa! Aconteceu isso com você. Que história louca. E você tem coragem de vir ao encontro de uma pessoa que você nem conhece - diz demonstrando seriedade.

- Pois é, eu não sei o que eu estou fazendo aqui.

Com receio de perder a oportunidade, Roberta solta:

- E como é que chama esta amiga sua?

- Michelle - ele responde citando o nome da amiga, que se identificou pelo nome verdadeiro desde o início.

 Não poderia mais esconder. Disfarçando a ansiedade, contraindo todos os músculos e sentindo que o momento de dizer a verdade chegara, ela suspira:

- Olha... E seu eu te disser que a Michele sou eu?

- Ahnn... Sério?? - responde com um olhar espantado.

E este foi o começo de uma relação que durou duas semanas. Logo, o príncipe virou um sapo. Não foi desta vez que Roberta encontrou sua cara-metade. Decepções acontecem. "Mais vale a certeza de um não do que a dúvida de um sim." Com esta máxima, ela defende suas empreitadas, que não pararam por aí.

Sem medo de continuar sua busca, decidiu fazer uso da tecnologia. Internet. Amigos on-line. Após uma rápida pesquisa, seleciona alguns rapazes "interessantes". Com uma mensagem padrão, dispara e-mails para os pretendentes. Encontra outro príncipe, que literalmente a enfeitiça. O encontro real aconteceu quinze dias após o encontro virtual.

Apesar de saber que não haveria progressos, deixou a magia a conduzir por um ano. "Ele foi sincero. Abriu o jogo no início. Então, se em algum momento eu pensei que fosse dar certo, logo vi que estava enganada." Confessa que foi difícil resistir. E não insistir. Mesmo sabendo que não haveria futuro nesta relação, prensou o rapaz contra a parede. Outra característica sua é a persistência. Às vezes, exagerada. Como ela mesma define.

Hoje, ela está abraçada a uma nova causa. Ou caso. Já faz um ano que conheceu, na igreja, uma pessoa que atraiu sua atenção pela timidez e aparente solidão - sempre sozinho nas missas. Nunca conseguiu se aproximar. "Nem um sorriso ele dá." Tudo o que sabe dele, além de que o encontrará na missa todos os domingos, é a placa do carro. Onde está história vai parar, só o tempo poderá dizer. Entretanto, se depender da menina de rosto angelical e atitudes selvagens, ela não vai ficar estacionada. "Já perdi muito tempo. Preciso fazer alguma coisa."

Será este o príncipe, finalmente? "Não. Até agora não apareceu príncipe nenhum. Não tem nada de concreto. Só há a expectativa." Ela não se arrepende de nada que tenha feito, apesar de descrever todos os amores que teve como encrencas. Inclui neste ranking um namoro de seis anos.

Formada em Processamento de Dados pela Universidade da Cidade de São Paulo, hoje ela trabalha na Academia Paulista de Direito Criminal, escritório de advocacia na capital paulista. Não são raras as mensagens codificadas com citações jurídicas. Mas a sentença que mais aguarda é o amor. Sonha em casar, ter filhos. Tudo com pompas e circunstâncias.

No banquete filosófico eles já afirmavam que o amor é "aquilo que, com efeito, deve dirigir toda a vida dos homens, dos que estão prontos a vivê-la nobremente." Ela está pronta. Resta encontrar alguém disposto a compartilhar. Candidatos?

Texto escrito em 2004.



Michelangelo

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